sábado, 2 de outubro de 2010

texto do Michael Hardt


Segue abaixo tradução minha de texto do Michael Hardt sobre a COP 15 (o original está aqui). O texto de Hardt tem como ponto de partida esse acontecimento singular, no entanto possibilita a compreensão de certos conceitos trabalhados por ele e seu parceiro de escrita, Antonio Negri: o conflito entre Império e multidão – o Império, no caso, representado por aqueles com o poder de decisão sobre as questões climáticas, que são afrontados pela multidão que tomou as ruas de Copenhagen. Hardt centra seu texto no conceito de comum: a multidão produz a partir do comum, a produção é feita mediante redes que são comuns e produz mais comum. O comum é a riqueza da multidão, e por isso o capital tenta se apropriar dele.

The Common in Copenhagen

By Michael Hardt

O comum está se tornando rapidamente o terreno primário da luta política na era da globalização. Acabo de regressar de Copenhagen, onde durante as últimas duas semanas, a COP15, a Cúpula do Clima das Nações Unidas, tem sido palco de intensas negociações sobre a gestão do comum.

Principalmente está em jogo como e em que medida nós vamos compartilhar a riqueza comum neste mundo e também como vamos combater as formas destrutivas do comum, que ameaçam as nossas sociedades e as formas de vida na Terra

Quando eu digo que o comum está em jogo no processo de globalização, refiro-me, por um lado à terra, as florestas, o mar, à atmosfera, em suma, algo como o que era tradicionalmente chamado de comum. Por outro lado, o comum também concerne a uma série de resultados da produção e da criatividade humana, tais como idéias, imagens, códigos, saberes, informações e afetos. A questão da mudança climática se situa principalmente no primeiro deles, mas a relação entre essas duas noções do comum foi também um fator importante em Copenhaguen. [...]

Uma vez que concebemos a conferência de Copenhagen como uma luta sobre a gestão do comum, é útil separar esta luta em duas cenas relativamente separados. Uma cena aconteceu dentro das reuniões oficiais no centro de conferências do Bella Center, onde a admissão era estritamente limitada aos representantes do governo, ONGs aprovadas, alguns jornalistas e outros participantes selecionados. Passei a maior parte do meu tempo, no entanto, na segunda cena, fora das reuniões oficiais, entre os movimentos sociais e ativistas, cuja presença representou um importante encontro entre as tradições ativistas focadas no ambientalismo e nos diversos aspectos da globalização.

As reuniões oficiais foram o palco para uma série de intensas negociações sobre a forma e as hierarquias das estruturas emergentes de governança global que Antonio Negri e eu desiganmos como Império. É ainda mais claro hoje que há dez anos, quando começamos a pensar nestes termos, que nenhum Estado-nação, como os Estados Unidos ou a China, pode "ir sozinho" e governar o sistema global. Qualquer tentativa de unilateralismo está fadada ao fracasso. Em vez disso, vimos em Copenhagen um exemplo de como as estruturas emergentes de governança global estão sendo construídas dentro e entre três níveis distintos.

O nivel superior, que recebeu a maior parte da imprensa, é o local dos conflitos e alianças entre os estados-nação. Os Estados Unidos e a China, por vezes, se apresentam como representantes das partes "desenvolvidas" e em "desenvolvimento" do mundo, enquanto as nações européias (por vezes juntas, às vezes separadamente) conquistam uma posição mais matizada.

Algumas das posições mais interessantes, porém, são apresentadas por outros grupos, como o G77, uma ampla coalizão de nações subordinadas representada pelo embaixador sudanês Lumumba Stanislaus Di-Aping. As demandas do G77 e coalizões similares tornam impossível para um pequeno grupo de líderes da elite elaborar qualquer acordo global em particular.

Além disso, um número de nações latino-americanas, [...], bem como uma série de nações Africanas, demandam por reparações da dívida climática cometida pelos países ricos durante seus séculos de dominação industrial. Isso não quer dizer que todas as nações são iguais neste nível (ou, especificamente, no processo da cúpula), mas sim apontar que as hierarquias entre eles constantemente tem que ser negociada..

Um segundo nível do sistema emergente de governança global é o local onde as grandes corporações expressam seu poder. Os líderes corporativos, é claro, não eram oficialmente parte das discussões da ONU em Copenhagen, mas a COP15 foi, entretanto, claramente também um evento corporativo.

Embora grande parte do discurso oficial sobre a mudança climática envolve limitar práticas destrutivas de produção e consumo, "soluções verdes" são concebidas como um enorme campo de oportunidades de negócios. Isto é ilustrado de forma anedótica por uma das campanhas publicitárias mais visível durante a conferência, onde outdoors por toda a cidade tinham o slogan "Vamos fazer de Copenhague, Hopenhagen", em uma campanha patrocinada pela Coca-Cola, SAP e Siemens. Mais importante, porém, é a perspectiva de que a criação de enormes mercados de carbono (um componente provável de qualquer acordo eventual) irá fornecer uma expansão de oportunidades de investimento financeiro e lucro.

Um terceiro nível foi representado em Copenhague por um grupo variado de ONGs, organizações de defesa ambiental, meios de comunicação, e, o mais interessante, as organizações de direitos indígenas. Alguns desses grupos apoiam os esforços dos Estados-nação no primeira nivel e / ou as empresas no segundo, enquanto outros tentam combatê-los.

Em Copenhaguen, então, eu vi como as estruturas emergentes de governança global requerem um processo constante de negociação e colaboração dentro e entre esses três níveis. Este é um processo complexo que envolve uma série de estritas hierarquias internas, assim como a exclusão de uma grande variedade de vozes e populações, mas também abre a possibilidade de recusa e rebeldia de uma variedade de atores. Dentro dessas estruturas de governança global aparecem constantemente forças que podem reorganizar as hierarquias e até, às vezes, criar rupturas no sistema.

Fora da cúpula oficial em Copenhaguen, na verdade, na segunda cena de luta sobre o comum, uma das estratégias mais interessantes dos ativistas e movimentos sociais foi atuar em uma divisão entre os poderes dentro das reuniões. O conceito primário de "Reclaim Power" coordenou ações na quarta-feira, 16 de dezembro, que conectou "walking in" com "walking out”. [...]

Juntos, esses dois grupos, então, organizariam uma "cúpula do povo". A polícia dinamarquesa, através de prisões em massa e outras táticas, deixou claro que os dois lados não se encontravam [...] O significado conceitual do esforço, no entanto, ficou claro para todos os envolvidos, uma vez que "walking in” / “walking out" não só abre o processo decisório, mas também destaca os tipos de alianças que são possíveis dentro e fora das estruturas de governança global, as alianças que têm o potencial de criar alternativas reais

Devemos ter em mente que a base de tais alianças repousa sobre alguns conceitos fundamentais da gestão e da instituição do comum. Por exemplo, os principais mecanismos para enfrentar a mudança climática promovida pelas forças dominantes, como "cap and trade", envolvem transformar o comum em propriedade privada e, especificamente, transformar as emissões de carbono e de direitos de poluição em mercadorias e criar mercados em que podem ser negociado.

Essas estratégias são realmente compatíveis com a ideologia neoliberal e sua convicção de que a privatização sempre leva à eficiência. Os vários grupos de oposição que podem potencialmente formar alianças defendem uma variedade de soluções diferentes, mas todos concordam em sua hostilidade à estratégia neoliberal e a privatização do comum.

Finalmente, o que mais me interessou em Copenhagen foi a evolução dinâmica conceitual que teve lugar entre os diferentes componentes dos movimentos de protesto. Todo mundo estava bem consciente de que esta reunião realizou-se no aniversário de dez anos dos protestos de Seattle da OMC, e parecia natural refletir sobre onde nós estamos. Dentro dos movimentos de protesto, uma linha de divisão ou dinâmica de negociação que parece ser particularmente relevante para mim pode ser expressa em termos das duas formas do comum que eu mencionei anteriormente, o que implica, pelo menos aparentemente, duas diferentes abordagens políticas.

Por um lado, os que se concentram na primeiro forma do comum (incluindo a Terra, as florestas, a água e a atmosfera), tendem a destacar as limitações necessárias de uma política futura porque, na verdade, esta primeira forma do comum é realmente limitado. Um dos cartazes mais inteligente na manifestação de massa na semana passada, por exemplo, declarou: "Não há nenhum planeta B", o que significa que não temos alternativa senão enfrentar os limites dessa terra agora.

Por outro lado, as perspectivas em foco na segunda forma do comum (como idéias, conhecimentos, imagens, códigos, afetos, e assim por diante) concentram-se sobre as formas de acesso aberto que podem realizar o nosso potencial ilimitado para a criatividade e a produção, pois na verdade, essa segunda forma de o comum é ilimitada. O slogan "Nós queremos tudo para todos," um dos favoritos dos movimentos alter-globalização na última década, enfatiza tais possibilidades ilimitadas.

Houve, assim, claramente potencial para o conflito em Copenhagen entre ambientalistas exigindo uma política de limites (argumentando, em essência, "este mundo é ainda possível, talvez") e os activistas alterglobalização defendendo possibilidades ilimitadas (cantando "outro mundo é possível"). Mas tal conflito de fato não aconteceu.

No final, eu suspeito que a dissonância conceitual que reconheço entre os limites e o ilimitado é realmente um falso problema, e que os movimentos vão nos mostrar como essas posições não são contraditórias. Isso me lembra, de fato, de um outro falso problema que parecia carregar os movimentos de protesto, há dez anos, a aparente contradição entre o global e o local

Naquela época, aqueles que se oporam à globalização neoliberal corporativa promovida pelos atores dominantes na OMC foram rapidamente rotulados anti-globalização e, portanto, a favor da manutenção das fronteiras [...]. Levou tempo para os movimentos desenvolverem uma noção substancial de alter-globalização, que revelou que a contradição entre o global e o local era um falso problema. Hoje, meu sentimento é que os movimentos irão desenvolver uma política do comum que tanto reconheça os limites reais da terra e estimule a nossa capacidade ilimitada de criação – construção de mundos ilimitados em nossa terra limitada. Os encontros em Copenhaguen, em qualquer caso, foram um primeiro passo nessa direção.

domingo, 12 de setembro de 2010

biopoder e resistência nas favelas

Na mídia de massa, as políticas que se centram em valores modernos como crescimento econômico, urbanização e erradicação da pobreza são louvadas. Até ai parece que tudo bem, mas essas políticas e o discurso das mídias marginalizam cada vez mais os pobres, reforçando a subjetividade burguesa.

No entanto, os pobres não são agentes sociais negativos, eles têm sua potência; isso é visto em toda uma rede que tenta produzir relatos que mostram a sujeira dessas políticas e de seus representantes, a mídia.

O confronto entre a macropolítica e pobreza pode ser contemplado em notícias referentes às UPP’s (Unidades de Polícia Pacificadora).

No CMI é dito que a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas em 2016 fazem com que o Rio de Janeiro se prepare “para novos negócios, novos empreendimentos. A cidade dos contrastes precisa de mais máscaras que escondam a miséria, a desigualdade, a injustiça. [...] Várias favelas da zona sul e centro foram escolhidas para serem dominadas pelas UPP's”.

Ainda no CMI, há denúncias de abusos das UPP’s. Estas têm como desculpa a invasão de favelas para erradicar o tráfico, mas a repressão atinge também os moradores. Segundo o pessoal do Complexo do Borel, uma das áreas invadidas “toques de recolher, revistas vexatórias, invasões de residências, saques, agressões, torturas, humilhações e vários outros tipos de abusos vêm sendo cometidos pelos policiais contra os trabalhadores que vivem nas favelas do complexo.”

Até mesmo a cultura das favelas não fica ilesa, como é visto no gerenciamento de bailes funks pela polícia. Segundo texto da Folha de SP, no qual é dado mais atenção ao ponto de vista da policia, sendo seu porta-voz, os bailes “não poderão disseminar conteúdo pornográfico nem os chamados proibidões (funks que fazem apologia ao crime). [...] É a hora do funk de respeito."

“... Foucault definia o ‘biopoder’ como um ‘assalto’ do poder à potência da vida da população considerada como espécie, como principio produtivo...” (Giuseppe Cocco em MundoBraz).

O poder de segurança, a sociedade de controle, é o biopoder. As políticas do Estado e suas UPP's são exemplos desse poder sobre a vida. No entanto, a favela é foco de resistência, e tem suas positividades: nascem da busca por melhores condições de vida; nelas surgem movimentos de moradores que lutam por seus direitos, regularização; também as favelas fazem autoconstrução do ambiente urbano.

“... em lugar de sumir as periferias resistem – e falam cada vez mais alto, produzindo mundos culturais paralelos (...) dentro dos quais passa a viver a maioria da população dos vários países, inclusive do Brasil” (Cocco em MundoBraz).

Mesmo com as favelas invadidas pelas UPP's, o poder da vida resiste. Encontrei no youtube vídeos-clipe de músicas que fazem crítica ao domínio da polícia nas favelas, tendo como pano de fundo imagens de pessoas do tráfico. Mesmo que os vídeos façam apologia ao "crime", eles são gritos de resistência. Posto alguns abaixo.







domingo, 5 de setembro de 2010

Climate Camp

“Ação direta é uma forma de activismo, que usa métodos mais imediatos para produzir mudanças desejáveis ou impedir práticas indesejáveis na sociedade, em oposição a meios indirectos, tais como a eleição de representantes políticos que prometem soluções para uma data posterior... "(WIKIPÉDIA).

Segundo Bruno Andreotti (em sua dissertação, "Poder e resistências: uma cartografia do movimento de movimentos"), “há uma diferença entre a prática anarquista da ação direta como experimentação da liberdade, como prática de liberdade, afirmação de uma resistência que se exerce, e a ação direta como instrumento para alcançar um objetivo, um meio para determinado fim, ou ter determinada reivindicação atendida.”

Um exemplo de ação direta contemporânea, que agencia os dois tipos de práticas expostas por Andreotti, mas que dá mais importância à ação “como experimentação da liberdade”, é o Climate Camp. Este faz acampamentos em lugares inusitados, como o centro de cidades, principalmente no Reino Unido, e tem como foco a insurgência contra as políticas capitalistas do Império que afetam o bem comum da multidão, a vida no planeta. O Climate Camp escolheu as alterações climáticas como símbolo desse poder sobre a vida.

“Os acampamentos começaram em agosto de 2006, quando 600 pessoas reuniram-se na maior fonte do Reino Unido de dióxido de carbono para dez dias de aprendizado e vida sustentável, que culminou em um dia de ação de massas. Em 2007 o Climate Camp fez ações contra a expansão do aeroporto de Heathrow, a poucos metros do local, com mais de 2 mil pessoas. Em abril de 2009 concentrou-se nas causas subjacentes às alterações climáticas, o sistema econômico mundial, montando um acampamento no G 20.” (do About Us do Climate Camp). Ainda em 2009, em dezembro, aconteceu um acampamento em Londres em uma das áreas mais movimentadas do mundo como protesto contra a COP 15. No mês passado a tática ocorreu na Escócia.

“Cada acampamento trabalha com quatro temas fundamentais: educação, ação direta, vida sustentável e a construção de um movimento para combater eficazmente as alterações climáticas. As pessoas que participam são voluntárias; gente como professores, enfermeiras, doutores, jovens trabalhadores, artistas, estudantes, carpinteiros, encanadores.” (do About Us do Climate Camp). O movimento é aberto, descentrado em inúmeros grupos. Como outras resistências atuais não têm líder, não se refere a partidos ou a tipos de organizações tradicionais.

Busquei imagens no youtube sobre os acampamentos, e encontrei algumas coisas. Do famoso Camp realizado conjuntamente a COP 15 na Trafalgar Square, em Londres, tinha pouca coisa. As imagens mais significativas eram de um documentário feito pelos próprios campistas da invasão da área central de Londres, durante o G20 de 2009. Postarei o documentário no fim do texto.

Nas imagens dá para ver um acampamento (literalmente) no meio das ruas, com barracas, gente cantando, palavras de ordem, uma coisa meio hippie. No entanto, encarando-o no vídeo, pela forma de re-apropriação da cidade, dá para perceber uma semelhança com táticas situacionistas, como a psicogeografia e a deriva que eram atualizadas na cidade.

Essas táticas, feitas no tecido urbano, possibilitavam um devir-menor da cidade e um devir-cidade para a trupe de Debord. O devir é uma linha de fuga frente aos modelos dominantes, ao que está estabelecido. Estes duplos devires concerniam a linhas de fuga referentes à subjetividade urbana dominante da época dos situacionistas: o operário assalariado, massificado, consumidor.

Nos acampamentos a cidade entra em devir, se torna minoritária, abre-se para um novo campo de possíveis. A cidade e seus sujeitos, rotinas, necessidades, seu diagrama de poder fogem para todos os lados. No entanto, diferente dos situacionistas, o objetivo dos acampamentos é a insurgência ao capitalismo global, que afeta a todos, afetação simbolizada nas mudanças climáticas, que são gerenciadas pelos países e corporações dominantes.

Também, diferente dos situacionistas, os acampamentos enfrentam uma outra forma de poder, a sociedade de controle, com suas capturas em espaço liso, suas formas de apropriação da subjetividade que se estendem por toda a vida. Por fim, o pessoal de Debord era uma vanguarda, para poucos. Os acampamentos reúnem milhares de pessoas e, mesmo que estejam localizados no Reino Unido, fazem parte de outros movimentos globais como o
Climate Justice Action.



sábado, 28 de agosto de 2010

o Centro de Mídia Independente Brasileiro


O CMI-Brasil faz parte da rede de Centros de Mídia Independente (indymedia) que tem como mecanismos mais visíveis sites de noticias. A rede é mundial, está presente em todos os continentes. Cada centro é autônomo. Mesmo assim, eles colaboram entre si e compartilham elementos: são abertamente anti-estatais, anti-corporativos, prometem fazer coberturas contra-midiáticas, os membros não são profissionais, e mais que comunicadores são ativistas.

O CMI-Brasil é um caso particular. Os temas das matérias dizem respeito principalmente a questões brasileiras, mesmo que haja espaço para a América do Sul e Latina e, em tamanho reduzido, para questões globais. O localismo do CMI-Brasil aponta sua potência; seu foco é os pobres brasileiros, que ou são representados nas notícias ou produzem suas próprias notícias. Esses pobres são os movimentos de luta e resistência.

O que eu realmente gostaria de salientar, é a negação pelo CMI da pauta midiática majoritária brasileira. Não foi publicada nenhuma matéria sobre os presidenciáveis no site nos últimos meses; como também nenhuma pesquisa de opinião ou estatísticas sobre as eleições, e nem será publicado. O CMI abertamente nega esse lado da política: a política dos gabinetes, das instituições, dos poucos que agem sobre os muitos.

A proximidade com o “tema eleições” apenas pode ser contemplada numa matéria do dia 23 de agosto que faz campanha contra a representação do Estado, na qual é dito: "queremos que a responsabilidade do governo não seja exclusiva de um grupo, que não haja dirigentes profissionais.”

No entanto, a negação da pauta midiática majoritária é realizada em parte, pois o CMI é divido em dois tipos de publicação, uma feita por seus membros (ou proposta a partir de textos principalmente de movimentos sociais), e outra por qualquer um mediante sistema de publicação aberta.

Os membros seguem rigorosamente a política editorial do CMI, política mais que razoável, criada a partir de posicionamento ético e que concerne aos temas antes expostos. Já a publicação aberta, que deveria ser o grande trunfo do CMI, por permitir que qualquer um se torne produtor, traz uma multiplicidade de assuntos, e parte, não insignificante, gira em torno das questões eleitorais.

Ou seja, a criatividade do CMI de escapar da pauta midiática, da grande política, é impedida exatamente em seu mecanismo mais importante. Digo criatividade, pois esse discurso sobre as eleições é corrente, faz parte das opiniões, é um discurso dominante, que ao ser rompido produz um contra-discurso poderoso que concerne a uma outra política.

Global Brasil

A revista Global Brasil surgiu a partir dos Fóruns Sociais e busca fazer um apanhado das lutas da multidão, tanto globais, quanto da América Latina e do Brasil. Em suas doze edições (a última é deste ano) estiveram presentes teóricos firmados ligados às resistências, entre eles: Giuseppe Cocco (autor de MundoBraz, companheiro de escrita de Antonio Negri), Suely Rolnik (que escreveu com Félix Guattari, Cartografia do Desejo), Ivana Bentes, Cezar Altamira, Fábio Malini. Também teóricos renomados mundialmente colaboram com a revista como Antonio Negri, Michael Hardt e Paolo Virno.

É interessante notar que são correntes na Global conceitos criados por Antonio Negri, como: multidão e Império, biopoder e biopolitica, produção do comum, projeto de democracia, entre outros. Assim poderíamos dizer que a revista assume para si uma posição Negriana.

Os temas da Global centram-se na luta da multidão, por democracia, fim das desigualdades, por direitos. O grande tema seria pensar nas possibilidades de abertura dos governos, fazendo com que eles expressem a multidão e não a represente.

A expressão da multidão a coloca em um espaço ativo, fazendo com que o Estado, como governo de poucos sobre muitos, se abra em rede a inúmeras singularidades, descentrando o poder. Por compactuar com o projeto Negriano, a revista também discute a possibilidade de governança que produza alternativa à dependência ao mercado global mundial do Império.

A Global percebe na emergência de governos de esquerda na America do Sul uma mudança que poderia abrir um campo de possíveis para a radicalização democrática; mas lúcida não se alia a partidos, ao Estado, máquina representativa, muito menos a corporações e sua falsa representatividade.

O caso do Brasil é central nas discussões. Um tema resume o posicionamento da revista, o Bolsa Família, que é exposto em inúmeras edições. Este, como em projetos parecidos na Europa e América do Norte, garante renda para os pobres. A existência do Bolsa Família significa que todos são produtivos, que a vida é levada a produzir e assim sofre capturas. Essa vida seria valorizada financeiramente.

Também a pobreza como tema se alia a um outro tipo de relação com a pobreza na Global, pois esta não tem os pobres apenas como conteúdo, mas dá espaço para eles se exporem. Na última edição, inúmeros artigos e manifestos de movimentos discutem as condições de vida nas favelas e seu enfrentamento com certas políticas públicas (a maioria); estas veem os "favelados" como vidas que não merecem ser vividas, como estorvo, como resquícios pré-modernos.

A última edição da Global Brasil está disponível aqui. Os outros números podem ser baixados aqui.

domingo, 22 de agosto de 2010

produção e captura nas mídias

É difícil não buscar informações nas grandes mídias, talvez por hábito. Elas fazem seu serviço, nos dão informações sobre o presente, no entanto o presente que elas representam é o das instituições, do mercado, da política dos gabinetes, e quando as mídias olham para as ruas, o que veem é a violência que deve ser controlada pela polícia: o crime ou os movimentos da multidão. O consumo é louvado, o Estado posto em posição de destaque, já os pobres devem ser eliminados, em políticas públicas ou em seu próprio discurso.

É difícil não estar conectado com as grandes mídias, mas cada vez é mais fácil. Segundo Fabio Malini, essas mídias perdem sua hegemonia, pois a multidão sabe, e muito bem, que não dá para confiar nelas. Essa crítica feita pela multidão expõe sua sabedoria. A negação das mídias é clara no desenvolvimento acentuado de canais alternativos. Quem quer informação busca em fóruns, blogs, sites, as grandes mídias são apenas mais um canal possível de informação, que todos têm com desconfiança.

Interessante, pois esse movimento de resistência contra as grandes mídias, essa resistência primária que simboliza um não, é conjunto a outro, pois esses que buscam informações, também criam informações. Esse segundo gesto aponta a positividade da multidão. Um dos aspectos do pós-fordismo é que os tempos de produção e re-produção se confundem: estamos sempre produzindo, a qualquer momento e lugar. Assim sofremos explorações em toda vida, mas também nela resistimos.

Os blogs, os sites, as redes de comunicação, são feitos a partir do desejo de produção que escapa das valorações capitalistas. A internet é o meio para a criação de linguagens, idéias, informação, comunicação, e assim de relações, afetos, sociabilidades, características do trabalho hegemônico do pós-fordismo, o imaterial.

Produzir na internet exige, além do desejo de comunicar, não muito, um computador e uma conexão, e conhecimento mínimo de informática e da língua. O acesso hoje é quase para todos; qualquer um pode pagar alguns reais para uma lan house. O resto só não é possível, mesmo no Brasil, para uma minoria.

Os mecanismos mais importantes da internet são os agenciamentos entre a busca e produção de informação diferencial. Locais em que a dicotomia emissão e recepção é visivelmente esmaecida, como nas publicações abertas. Exemplo é a Wikipédia: projeto colaborativo, sem fins lucrativos, que é centrado em um desejo por conhecimento. Ali a produção é aberta e colaborativa. Aberta, pois qualquer um pode publicar; colaborativa, pois após a publicação ela sofre controle por parte da multidão que complementa, sinaliza, exclui – isso pode ser visto nos comentários que acompanham cada verbete.

Essa é outra característica da produção atual: ela é feita em redes de colaboração e comunicação. Aliás, a multidão conceituada por Negri e Hardt é uma rede de singularidades que agem em comum: rede que deseja outra realidade, inteligente, não centrada em individuo soberano, como o povo.

Interessante que a Wikipédia funciona e muito bem. As informações são mais que eficientes para um tipo de pesquisa rápida e direta. É claro que a Wikipédia é o lado positivo da internet, o lado negativo são os bancos de dados, feitos para poucos, para aqueles que só podem os usar mediante relações financeiras: jornais, revistas, produtos como filmes, softwares, músicas, livros, ou mesmo os grandes portais que têm como fim o lucro: como no caso da TV e do rádio, se tem acesso, pois a publicidade paga.

Assim há dois movimentos: a captura pela lógica do lucro, pelos capitalistas; a fuga para todos os lados da multidão. Um é o poder da vida, a produção, a criação, o desejo, outro o poder sobre a vida, a captura do desejo pelo mercado.

os movimentos por outra globalização hoje

Tenho encontrado cada vez mais trabalhos acadêmicos sobre os movimentos antiglobalização, principalmente aqueles situados entre Seattle 1999 e Gênova 2001. Estes acontecimentos seriam algo como o 1968 contemporâneo, nos quais lutas em rede, a partir de multiplicidades de singularidades agindo em comum, se insurgiram contra o Império (este também em rede) e seu capitalismo mundial.

Essas lutas entraram em crise em Gênova, passando para uma nova fase nos Fóruns Sociais Mundiais. Também em 2003 protestos em todo o globo contra a guerra manifestaram a expressão da multidão. Porém a ressaca pós-11/9 já havia capturado os movimentos: ficou difícil de se locomover pelo mundo atrás de manifestos após a queda das torres gêmeas: um estado policial se impôs contra manifestações, e boa parte dos grupos preferiu dar atenção às questões da guerra, deixando a luta contra o capitalismo na geladeira. Por fim a guerra proclamada por Bush foi um choque para aqueles que desejavam paz, liberdade e democracia imanente absoluta.

Depois disso, acontecimentos de grande impacto não mais seriam realizados. Muitas singularidades simplesmente desapareceram, e o Fórum Social que já representava o fim das práticas de ação direta deixa de ser alternativa. Bem, essa é a história que ficou para trás, e que está sendo contada.

No entanto, ainda há a presença de multidões que resistem em cada encontro de líderes da ordem mundial. Os dois exemplos mais significativos da realidade imediata foram o último G20 no Canadá que permitiu manifestos com mais de vinte mil pessoas, e o acontecimento de maior porte, que fez com que fosse reavivado o imaginário das lutas de Seattle, a COP-15. Nesta, 100 mil pessoas lutaram abaixo da repressão em peso da polícia em Copenhagen, e mais, também aconteceram manifestos globais maciços, principalmente na Inglaterra e na Austrália, ambos com mais ou menos 50 mil pessoas.

Seattle abriu um campo de possíveis que continua a ser atualizado. As formas de luta, de criação de espaço comum, os discursos, a multiplicidade de singularidades, sujeitos, dispositivos, táticas, presentes na COP 15 em boa parte devem à Seattle. Pelo menos se aprendeu muito com aqueles dias de ação global.

Descendo para o empírico, alguns grupos que estiveram presentes em Seattle e Gênova ainda estão ativos nos dias de hoje. Um deles é o Reclaim the Streets (RTS), coletivo inglês que toma as ruas em carnavais contra o capitalismo. Parece que não há mais interesse pelo RTS na luta contra o capitalismo através do choque direto ao Império nas reuniões de seus líderes; mas continua organizando suas festas. O último encontro do RTS foi em Londres em um squat. O papel significativo do RTS nas lutas globais foi exposto no livro Urgência das Ruas.

Outro grupo é o Black Bloc. Este é o lado mais violento dos movimentos de resistência. Destrói propriedade privada ligada a grandes corporações. Entra em conflito com a polícia. Os Black Blocs são abertos, qualquer um pode fazer parte. Não é um grupo específico, mas uma tática de ação direta.

Os Black Blocs causam controvérsia, pois muitos os consideram como deslegitimadores de manifestações, isso aconteceu tanto em Genova quanto na COP-15. Antonio Negri diz que os Black Blocs são facas de dois gumes, pois secciona os movimentos, mas atraem a atenção das mídias.

Seria importante um mapeamento das continuidades de Seattle e das novas linhas de força atuais. Se as características mais importantes de Seattle eram a rede de singularidades que agem em comum, aberta, que busca a atualização de democracia em espaço local, as práticas de ação direta, a luta comum contra o inimigo global, o capitalismo mundial, vemos que a COP-15 foi manifestação de ordem parecida com aqueles movimentos da virada do século. Um grupo se formou em Copenhagen com essas características, o Climate Justice Action.

Este é uma reunião descentrada, com a forma de rede, de inúmeras singularidades de todo o mundo, também do Brasil. Após a COP 15 o Climate Action continua firme fazendo suas ações; já aconteceram diversas esse ano e agora há a preparação para a nova conferência do clima em Cancún.

domingo, 15 de agosto de 2010

ainda sobre as eleições

Saiu mais uma pesquisa de opinião do datafolha que foi estampada na capa do jornal Folha de São Paulo. Dilma está apenas a três pontos de ser vitoriosa no primeiro turno. A Folha de sábado (14 de agosto) dedicou boas páginas sobre a ascensão de Dilma e o PT. As mais interessantes foram as da seção Opinião.

No editorial foi dito: “num momento em que aumenta a sensação de bem-estar provocada pelos bons ventos econômicos, o poder de inércia do continuísmo parece difícil de ser contido.”

Já a Opinião de Cesar Maia teve como título “Chavismo tupiniquim”, na qual ele faz aquela relação que todos bem conhecemos entre Lula, Chaves e Cuba; o Lulismo (que como sabemos terá continuidade com Dilma, pois, como diz o jornal em outra opinião do mesmo dia, ela é “a mulher de Lula”) seria algo entre os regimes “autoritários bolivarianos” e uma “democracia”. Maia ainda faz estranho comentário sobre o PNDH: este seria ataque a valores morais, e assim sinal de autoritarismo (?).

Por fim, as duas últimas opiniões, uma é sobre as FARC e a outra fala sobre Chaves. Lembremos que Serra e seu vice fizeram publicamente declarações de que o PT tem vínculos com a organização colombiana.

O que dá para concluir com tudo isso: a Folha não tem o menor pudor em tentar atacar Lula, o PT e, assim, Dilma. A Folha não tem medo de fazer parte do PIG – o Partido da Imprensa Golpista que se refere principalmente à tentativa de ataque ao governo Lula pela imprensa brasileira. Também o PIG historicamente tentaria deslegitimar qualquer governo mais à esquerda no país.

Segundo Paulo Henrique Amorim “o termo PIG pode ser definido da seguinte forma: Em nenhuma democracia séria do mundo jornais conservadores, de baixa qualidade técnica e até sensacionalistas, e uma única rede de televisão têm a importância que têm no Brasil. Eles se transformaram num partido político — o PiG, Partido da Imprensa Golpista.” (WIKIPÉDIA)

Esse tipo de jornalismo tem como seus casos mais extremos a Veja, Olavo de carvalho, e aqui no sul Diego Casagrande. Mas jornais como a Folha são talvez mais perigosos, pois não afetam apenas os mais ingênuos (aqueles que são leitores da Veja), pois seu ar de jornalismo sério, imparcial, objetivo, principalmente, elitizado permite a Folha fazer sua guerra mantendo a pose.

No entanto esse poder das grandes corporações de mídia, do PIG, na atualidade é relativo, pois os receptores não são ingênuos, eles reconhecem a guerrilha da informação, fazem sua resistência; e essa resistência é vista na popularização da internet.

Segundo o verbete da Wikipédia sobre o PIG citado acima, Lula teria sido eleito pela sua publicização na internet.

Ou seja, sujeitos e grupos cansados do discurso unilateral produziriam seus próprios discursos, em blogs, fóruns, sites alternativos, ou buscariam canais diferenciados de comunicação. Assim há um jogo de forças: as mídias de massa tentam manter seu monopólio, a multidão foge para todos os lados conectada na rede.

Para finalizar, uma dúvida: por qual razão um governo integrado com o capitalismo mundial, como o de Lula, ainda incomoda? Sabemos que a mente é lenta; é difícil perceber as mudanças, que o PT não é o PT dos anos 80; mas não podemos subestimar a grande mídia, ela dever ter motivos que desconhecemos para tentar fazer o seu golpe (sujo). Possivelmente tenta testar seu poder no país.

produção a partir do comum

É interessante que uma dissertação tenha uma assinatura, diga respeito a um autor, ainda que seja dividida essa autoria com o orientador. Quando se fala na primeira pessoa do singular, em dissertação, tese ou artigo, todos entendem.

Digo que é interessante, pois a pesquisa não se refere apenas a um sujeito, aliás, esse sujeito é apenas uma das linhas que compõem o mapa da pesquisa. Alguns dos componentes desse mapa poderiam ser organizados em dois grupos: um que concerne à estrutura institucional, do curso, e outro que faz parte de um bem comum da multidão – é este último que afirma que a pesquisa e todas as idéias contidas nela não surgem do nada, muito menos de uma mente pensante, um sujeito criador.

Quanto ao trabalho conjunto que se refere à instituição, por trás (como acima, do lado, embaixo) do aspirante a pesquisador há oficialmente todo um aparato, como disciplinas, orientação, grupos de pesquisa, bancas, palestras; e esse aparato permite também trocas informais, como as conversas nos corredores, bares, etc. com colegas, professores. E tudo isso determina a pesquisa.

Já o bem comum (prefiro dizer da multidão e não da humanidade) que envolve a pesquisa (e que abraça o componente anterior), poderia ser dividido em dois subgrupos: o mais visível se refere às teorias acionadas, o outro, a um imaginário compartilhado, enunciados, que são formados na vida.

Algo como a criação de algo singular parece muito difícil em um curso de pós-graduação, principalmente no mestrado. As dissertações e teses que caem em minhas mãos são em boa parte compilações de idéias de inúmeros autores. Isso acontece também entre autores renomados, que são criativos em suas leituras, mas que às vezes escrevem duzentas páginas para dar consistência a um conceito; e isso já é muito, pois como dizia Deleuze: o trabalho de uma vida pode ser apenas uma pintura, só isso deveria deixar qualquer um satisfeito.

Essas compilações, releituras, revisões de autores, muitas vezes servem para dar fundamento à análise de um objeto empírico. O objeto é condicionado pelas teorias ou leva a teorias já firmadas. Assim é a escolha do tema, a delimitação do objeto que aparece como aquele algo singular da pesquisa.

Os trabalhos acadêmicos que são apenas leituras de certos autores, eles são muito importantes. Como tal conceito atravessa a obra de inúmeros autores? Como tal conceito aparece na obra de tal autor?

Quanto ao imaginário compartilhado, ele é difícil de ser mapeado. De quem são as idéias que temos? Sabemos que não são nossas. Guattari falava em produção de subjetividade capitalística, esta formada por inúmeras máquinas, uma delas a mídia. As mídias legitimam o Império através desse poder sobre o desejo.

Na pesquisa um dos passos para a produção daquele algo singular, seria um processo de dessubejtivação, cair fora dos modelos; o problema é que não podemos realmente cair fora.

Falo sobre singularidade na pesquisa, pois há desejo de todo aquele que faz tal tipo de curso, de influenciar a comunidade acadêmica, o campo de estudos, além do mais se for um em formação como o da comunicação. Os professores, desde os primeiros dias de curso, nos dizem que esse desejo deveria servir como um norte; mas para mim, no caso do mestrado, o que está em jogo é a formação de um futuro pesquisador, e não o funcionamento de um campo. Neste caso sim, há a tomada de poder por um jogo egocêntrico, que limita a pesquisa; mas não acredito que no mestrado dê para fazer muito mais do que isso.

domingo, 8 de agosto de 2010

rizoma.net

Textos que estavam presentes no site Rizoma.net estão disponíveis agora no formato de e-book. O rizoma era um site que reunia artigos sobre as resistências contemporâneas. Além disso, havia muita coisa sobre movimentos de resistência historicamente importantes, como o situacionismo. Como também boas traduções de teóricos críticos como Guattari, Deleuze, Foucault, Franco Berardi. O rizoma foi desativado em 2009 após a morte de seu mentor, o ativista e teórico Ricardo Rosas. Quanto ao material está disponível no seguinte link.

Eu gostaria de falar um pouco sobre o conteúdo do site. A grande sacada do Rizoma.net era mostrar como campos heterogêneos se interpenetram e possibilitam potência: arte, mídia, política, urbanismo, etc.

Poderíamos fazer um traçado histórico dessa conexão de campos. Debord (figura quase ditatorial dentro do situacionismo) e seus companheiros, nos anos 60, misturaram crítica social e arte e métodos ligados ao urbanismo: deriva, psicogeografia.

As vanguardas históricas já agenciavam política e arte: dadaístas, futuristas, os movimentos russo. Também o surrealismo de Breton, em determinado momento, se aliou ao socialismo; e arte como mudança social ganha consistência com a Bauhaus.

No caldo que emergiu o situacionismo, também estava a trupe de Abbie Hoffmam que produzia happenings políticos. Uma vez, Hoffman e um grupo de hippies entraram na bolsa de valores e jogaram centenas de notas de dólares para os corretores, que entraram em frenesi. Outro grupo da mesma época fez política com música, os Panteras Brancas – mas política radical diferente da de Lennon ou Dylan. Uma década depois, os punks fazem sua critica niilista social, que culmina no hardcore dos anos 80.

Ali na virada do século 21, arte, política e mídias se unem contra o neoliberalismo e o capitalismo propondo uma globalização alternativa. Não era necessariamente arte, mas táticas criativas. A agitação dos movimentos por outra globalização gerou explosão de coletivos: reunião descentrada de pessoas que atuam em alguma área, normalmente midiática-artística, mas sempre com uma tendência política.

No campo de estudos da comunicação cada vez mais há espaço para movimentos que mesclam arte, política, mídia, etc. Podemos delinear três categorias que concernem às formas como esses movimentos se conectam com as mídias: 1. para se expor ao mundo, criam táticas que os coloque na pauta das mídias hegemônicas. 2. Mídias servem como instrumento: sites, vídeos. 3. As mídias como modelo de organização. Quanto a isso, segundo Antonio Negri, grupos de resistência usariam a forma da internet: redes descentradas, compostas de singularidades autônomas.

Talvez hoje a mistura entre arte, política e outros campos seja mais eficaz exatamente por esse último elemento, a organização horizontal descentrada. O que temos hoje é uma multidão, ou melhor, uma multiplicidade de singularidades que querem fazer multidão. E o que importa é o desejo de outra realidade, de resistência.

o debate dos presidenciáveis

A Bandeirantes apresentou na quinta-feira à noite (5/8) o primeiro debate entre os candidatos à presidência. Ou pelo menos quatro deles: Dilma, Serra, Marina e Plínio. Segundo a Folha de São Paulo: “a Lei Eleitoral exige que debates no rádio e na TV tenham a presença de todos os candidatos de partidos com representantes na Câmara dos Deputados.”. Isso trouxe à tona uma nova figura, Plínio do PSOL, que não estava presente nas pesquisas de opinião, e assim na mídia hegemônica.

A grande mídia como inúmeros blogs se preocuparam com quem ganhou o debate; gostaria de fazer minha crítica partindo daí: quem ganha com tal tipo de evento?

Vamos pensar no funcionamento de um debate, ele deveria servir para deixar visível a posição dos candidatos. Mas é isso mesmo? Sabemos que emissoras de TV funcionam com o financiamento da publicidade. Esta (a publicidade) paga às emissoras para nós assistirmos gratuitamente TV (essa afirmação se torna problemática com o boom dos canais pagos, mas aqui será mantida uma visão mais tradicional do tema). Nós entramos como consumidores de publicidade; como no trabalho entramos como produtores. E o debate serve como chamariz.

O interessante que nesse caso, nós não consumimos apenas os intervalos, a publicidade, pois há um outro produto: os candidatos. Estes e seu staff nos vendem uma imagem, e nós a compramos com votos. As mais belas propostas são as que mais vendem. Mas não só propostas, como também o modo de falar, o cabelo, a face. Como disse os comentários que circularam sobre o evento, eram sobre quem tinha vencido, ou seja, quem foi o produto mais “comprável”. Candidatos e publicidade: não há distinção entre eles.

As notícias sobre os candidatos, os debates, atraem consumidores de publicidade. Assim a relação que deveria ser democrática, trazer informação sobre eleições para o público, é uma relação comercial.

Talvez por isso as matérias da Folha de São Paulo – aliás, muitas na sessão Poder – dêem mais atenção ao que foi dito por Dilma e por Serra, pois eles são o grande produto, o que mais vende, por terem maior número de possíveis votos, assim de eleitores-receptores de mídia. No entanto o humor, a língua afiada de Plínio, o tornou notícia. Apareceu na Globo News e na Folha no dia seguinte. É claro que não foi dada atenção para seu programa que o próprio chama de “radical”: redução de jornada de trabalho, limite de propriedade rural, distribuição de renda. E sim atenção para ele como figura curiosa.

Por fim, um jornalista opinativo falou minutos antes do show: cada um dos candidatos tem suas estratégias para atingir seu objetivo: ganhar o debate, as eleições, lançando mão de marketeiros, publicidade. Isso é naturalizado. Ganhar votos, seja como for, parece ser o mais importante. As mídias não dizem se isso é ético ou não.

domingo, 1 de agosto de 2010

autogestão e a paranóia vermelha

O CMI publicou matérias sobre a autogestão dos trabalhadores da fábrica Flaskô (Sumaré – SP) nos dias 13/2, 13/07 e 21/7, fazendo uma bela divulgação positiva de tema que a pauta midiática ou nega ou critica. Parte do material se refere ao site do movimento das fábricas ocupadas que dá base para a experiência.

A Flaskô está sendo gerida pelos próprios trabalhadores desde 2003. Além disso, eles produzem projetos sociais que auxiliam mais de 300 famílias. A fábrica foi apropriada após sua falência. Foram mantidos os cargos anteriores, mas reduzida a jornada de trabalho para 30 horas. Não encontrei informação sobre os métodos utilizados de organização, se são descentrados. Nos últimos dias houve a tentativa de fechamento da fábrica, que foi revertida apenas com a intervenção do macropolítico Eduardo Suplicy.

Busquei notícias sobre a experiência de autogestão nos arquivos da Folha de São Paulo e na Folha Online e não encontrei nada. No portal UOL encontrei duas notícias de julho de 2009; ambas interessantes. Uma delas é entrevista com o “interventor federal Rainoldo Uessler [...] que afirma que os trabalhadores foram utilizados por um movimento ideológico-político-partidário [...] esse movimento seria a ala Esquerda Marxista, setor do PT." A outra notícia de uns dias depois tem como titulo: “Única fábrica ocupada do Brasil rema contra a maré e quer estatização”. Sobre a estatização, os trabalhadores querem que o Estado pague as dívidas da fábrica, mas que deixe a gestão em suas mãos.

Bem, quanto as duas noticias, o tom é o mesmo: relações entre o movimento da Flaskô e Chaves e sua Venezuela, ou seja, um bloco que faria parte da "ameaça vermelha”. No entanto esse discurso não é localizado apenas no UOL. A Folha de São Paulo, o Globo News e a rádio Bandeirantes FM, todos muito parecidos, fazem crítica estilo guerra fria contra a Venezuela, alas do PT, além de deslegitimarem certos movimentos como o MST.

Essa crítica com um certo ar de imparicialidade nos meios referidos acima, ganha uma dimensão absurda na Veja. Encontrei matérias de anos anteriores sobre a Flaskô na Veja.com; em uma delas a paranóia vermelha se torna psicose. A Veja, como também um lunático como Olavo de Carvalho, tenta criar um clima de ameaça constante de tomada de poder comunista no país. Ambos fazem parte de uma linhagem que não entende que a guerra fria terminou há muito tempo. Para estes o mundo é bipolar, dividido entre o bom capitalista e os que comem criançinhas. Lutam contra um inimigo que não está em lugar algum, o segundo mundo. Assim podem manter um tom severo contra qualquer tipo de mudança mais humana, associando a esse perigo vermelho. A loucura de Olavo de Carvalho é tão absurda que para ele mesmo a imprensa capitalista faz parte de conspiração "esquerdista" no país.

Na guerra fria os Estados Unidos lidaram com as resistências internas (dentro dos limites do país) aos governos fazendo algo parecido, as associando a União Soviética. Assim o conflito assimétrico da multidão foi simplificado na dicotomia leste-oeste. No entanto, estamos no Brasil, e o muro de Berlin caiu há vinte anos! Bem, acho que não preciso dizer mais nada.

sábado, 31 de julho de 2010

texto do Franco Berardi (Bifo)

“Franco Berardi, mais conhecido por Bifo (Bolonha, 1949) é um filósofo e agitador cultural italiano" (WIKIPÉDIA)

Conheci o trabalho de Bifo no hoje desativado site rizoma e em alguns textos do Peter Pál Pelbart. Fiquei bem interessado com a forma como ele relaciona comunicação e resistência. Guattari e Bifo tiveram ligaçoes com a emergência das rádios livres na europa nas décadas de setenta e oitenta. Infelizemente tem pouca coisa dele traduzida aqui no Brasil; de livros apenas a Fábrica da Infelicidade.

O texto mais recentes de Bifo que encontrei (de 2009) foi publicado no
generation-online, site que tem algumas traduções para o inglês de autores da crítica italianos, como o famoso Antonio Negri, e Paolo Virno que também trabalha com o conceito de multidão, entre outros.

Segue abaixo parte do texto que trata da crise atual do capitalismo e das potencialidades da crise. Tradução (livre) do inglês é minha do original que se encontra aqui.

O COMUNISMO ESTÁ DE VOLTA, MAS DEVERÍAMOS CHAMÁ-LO DE TERAPIA DA SINGULARIZAÇÃO
Franco Berardi

1. Além do nosso conhecimento

Economistas e políticos estão preocupados: eles chamam o que está acontecendo de crise e esperam que ela se revele como as crises que atingiram a economia no século passado, e que apenas deixaram o capitalismo mais forte. Eu acho que o que está acontecendo é diferente. Isso não é uma crise, mas o sintoma de incompatibilidade da potência das forças produtivas (trabalho cognitivo em rede) e o paradigma do crescimento. Isso não é uma crise, mas o colapso final de um sistema que perdurou pelos últimos cinco séculos.

As grandes potências mundiais estão tentando resgatar instituições financeiras. Mas o colapso financeiro afetou o sistema industrial, a demanda está caindo, empregos são perdidos aos milhões. No objetivo de resgatar os bancos o Estado está tirando dinheiro de impostos futuros, e isso significa que a demanda cairá ainda mais nos próximos anos. As despesas das famílias estão em declínio, e conseqüentemente a produção industrial será demitida. Isso não terminará em poucos anos, essa situação será eterna.

Em artigo para o Herald Tribune o conservador moderado David Brooks diz: “estou preocupado, pois estamos operando além de nosso conhecimento econômico.” Este é o ponto: a complexidade da economia global está além de qualquer conhecimento e governança. Apresentando o plano de regate de Obama, em fevereiro de 2009, Timothy Geithner, o secretário do tesouro americano, disse: “eu quero ser franco. Esta estratégia custará dinheiro, ela envolve riscos e tempo. Nós teremos que nos adaptar enquanto a situação muda. Teremos que tentar coisas que nunca tentamos antes. Cometeremos erros. Entraremos em período, no qual as coisas ficarão piores e o progresso será interrompido.” Enquanto essas palavras mostram a honestidade intelectual de Geithner e a diferença entre a nova liderança americana comparada com as “Bushites”, elas também apontam o colapso da autoconfiança política.

O conhecimento político que herdamos da filosofia racionalista moderna é inútil agora. Caos (um grau de complexidade que está além do entendimento humano) é o novo rei mundial. Os problemas que o mundo está encarando atualmente não podem ser resolvidos pelo caminho da adaptação e racionalização econômica. O paradigma capitalista não pode mais ser o domínio universal da atividade humana.
A história do capitalismo moderno acabou. E daí?

2. Net vs Crime

Vamos dar uma olhada retrospectiva na ascensão e queda da economia neoliberal, a economia da lei do mais forte. Há dois lados na economia pós-moderna dos últimos trinta anos: um que pode ser chamado de “Net-Economy”, e o outro, “capitalismo criminoso”. A net-economy é baseada na colaboração e compartilhamento, na criação de novas formas de administração da atividade social. A net-economy desafia o principio proprietário que reinou na sociedade capitalista moderna.

A fim de repensar e reimpor o domínio proprietário, o capitalismo reagiu de forma criminosa: a face criminosa do capitalismo é baseada no abandono de toda regra legal na busca de lucro e santificação da competição. Políticos criminosos levaram a economia global para a desordem presente, mas os criminosos estão ainda no poder em todas as nações, enquanto eles falharam em governar a realidade caótica criada pela desregulação. [...]

Uma contradição cresce entre o intelecto geral e a classe criminosa dominante. Quem vencerá?

A vitória de Obama nos Estados Unidos pode ser a abertura de um novo período na evolução da humanidade. Este acontecimento injetou novas esperanças no exército pacífico do intelecto geral em todo o mundo. O novo presidente foi eleito pelo trabalho cognitivo, e sua vitória é a derrota da classe criminosa representada por Cheney-Bush. Mas essa vitória marca apenas o inicio da luta que acontecerá entre as forças intelectuais e a força bruta da ignorância e do lucro.

A classe criminosa, composta de aventureiros das finanças, administradores de grande corporações, se apropriou do poder em duas direções: primeiro com a declaração neo-liberal da primazia da competição sobre qualquer domínio ético, político e legal. Segundo através da ocupação dos sistemas de produção da mente coletiva: o sistema de mídia. Fabricando esperanças e a imaginação coletiva, as mídias finalmente oprimiram a classe produtiva cognitiva; e dominou a exploração para os pesadelos dos explorados.

A privatização do espaço social comunicativo (propaganda, tv) produziu um efeito de alienação, de privatização da vida [...] que aniquilou com a solidariedade social, e forçou cada pessoa a pensar no isolamento de suas necessidades. Tome por exemplo a privatização da mobilidade, como uma distorção da esfera pública. Um objeto irracional, poluidor e desajeitado como o automóvel privado, foi objeto central da produção industrial no século 20.

Por qual motivo os automóveis têm que ser privados? Eles poderiam ser objetos públicos que cada pessoa poderia pegar e usar por um tempo, e então deixá-lo aberto na rua, pronto para o transporte de outras pessoas. Eles poderiam ser substituídos por um sistema de transporte público muito mais confortável. Por qual razão o sistema público de transporte foi sabotado pela classe dominante nas últimas décadas? Nós sabemos muito bem. A economia capitalista cria escassez no domínio dos transportes, como nos outros domínios. A criação de escassez é a premissa da acumulação, possibilitada pela privatização da necessidade.

Durante os anos 90 a ascensão da produção em rede e a expansão da cibercultura libertária abriram caminho para uma aliança entre capitalismo financeiro e trabalho cognitivo. Sob a bandeira do pontocom, jovens intelectuais e cientistas poderiam encontrar dinheiro para criar seus próprios empreendimentos, e um processo de redistribuição de renda tornou-se possível. Mas essa aliança quebrou-se quando a classe criminosa tomou o controle da nova potência tecnológica e a sujeitou ao poder da guerra. A experiência do pontocom foi capturada pela isca neoliberal, e na primeira década do novo século o trabalho intelectual tornou-se precário, forçado a aceitar todo tipo de chantagem econômica. A classe criminosa escravizou a classe cognitiva: o conhecimento foi fracionado, rendas reduzidas, a exploração cresceu.

O crash do pontocom e o 11/9 marcaram a submissão da experiência high tech. Isso perverteu a potência da tecnologia e do conhecimento, provocando incontáveis vítimas; o ódio se espalhou por todo o mundo. [...] Cidadãos do oeste foram convidados por Bush a viajar e consumir. Fazer shopping contra o terror, contra a depressão. Mas estes acessos massivos ao consumo eram financiados com uma vasta dívida. A população européia foi sistematicamente empurrada a comprar quantias enormes de coisas inúteis, mentalmente intoxicada pela publicidade e forçada a identificar felicidade com consumo e bem-estar com posses.

A privatização da necessidade e a redução do bem-estar a aquisições destruíram todo sentido de dignidade e amor próprio. O tempo social foi ocupado pelo fluxo de publicidade. [...] amor, ternura, sexo, afecções e cuidado com os outros transformaram-se em mercadoria. Cada pessoa tornou-se proprietária de muitos cartões de crédito, obrigada a trabalhar mais e mais a fim de pagar uma dívida cada vez mais crescente. Dívida tornou-se universal, e isso criou as condições perfeitas para o colapso. No fim o colapso aconteceu.

O crescimento nunca mais voltará, não apenas porque as pessoas não poderão pagar pela dívida acumulada durante as três ultimas décadas, mas também pelo fato de que os recursos físicos do planeta estão próximos do esgotamento, e os recursos nervosos do cérebro social estão próximos do colapso.

3. Protesto ético e Guerra

No fim dos anos 90, quando o processo de globalização e privatização estava além de criticas e sua potencial devastação estava bem escondida nas palavras dos gurus neoliberais, um movimento de protesto ético surgido da classe do trabalho cognitivo tornou-se consciente dos perigos da desregulação. No fim do século capitalista, em Seattle, centenas de milhares de pessoas se reuniram e marcharam com o objetivo de parar o encontro da OMC e protestar contra os efeitos da exploração global.

Foi o início da Era das Manifestações Éticas. De Seattle à Genova, de Praga à Bolonha, multidões de trabalhadores precários e cognitivos marcharam juntos. Eles eram a consciência ética do mundo, e, é claro, a agressão policial, instigada pela classe criminosa, tentou os esmagar. Alguns morreram, assasinados, pois falavam a verdade. Eles queriam avisar as pessoas do planeta que havia um grande perigo. Agora nós sabemos que eles estavam certos. Os No-global protesters davam a nós um aviso da catástrofe vindoura, e agora a catástrofe está aqui.

Catastrophe em grego significa uma mudança de posição que possibilita a visão de coisas que não poderiam ser vistas antes. Catástrofe abre novos espaços de visibilidade, e, portanto de possibilidade, mas também ela exige uma mudança de paradigma. Os manifestantes éticos foram derrotados após a marcha mundial contra a guerra em 15 de fevereiro de 2003. Cem milhões de pessoas marcharam contra a guerra no Iraque naquele dia. Bush disse que não precisava de conselhos, e ele começou a guerra.

eleições e resistência

Falta pouco para as eleições presidenciais. Temos três opções: uma a direita, Serra, duas no centro, o poder atual e a Marina. Essas três opções (e seus atributos) são as que a mídia nos dá, pois publiciza apenas elas em suas pesquisas e debates. Também a mídia nos dá outra opção: a aliança com a esquerda dita radical. A coisa é um pouco ambígua, pois o discurso da mídia relaciona os “radicais” também a certas alas do PT; e, além disso, mesmo o PT moderado é associado ao diabo: Chaves, Cuba, as Farc.

Bem, temos essas possibilidades: os presidenciáveis legitimados, ou nos marginalizar e ficar do lado da “escória vermelha”. Porém, segundo a mídia, não temos a possibilidade de contestar a própria estrutura do Estado, hierárquico, de poucos, essa democracia representativa que reproduz dicotomias: quem domina e quem é dominado. Contestação que romperia com a dicotomia, pois colocaria Chaves, Cuba, a esquerda “radical" e os aspirantes à presidência no mesmo saco.

Seriam interessantes pesquisas sobre essas pessoas que vão anular o voto, que não são poucas, para saber por qual motivo é posto de lado esse direito, símbolo da “democracia”. Provavelmente essa posição não é limitada a um discurso derrotista do tipo: dá tudo no mesmo, tanto faz.

Muita gente vai anular o voto, pois vê no Estado, um símbolo de centro de poder, e essa gente resiste ao poder dessa forma. Só que essa resistência é vazia. Estados-nação na globalização tem poderes limitados; os Estados dominantes dividem o poder com mega-corporações, instituições supranacionais. Os Estados subordinados, como o Brasil nunca foram soberanos; muitas forças exteriores agem e sempre agiram dentro do país. No entanto o gesto de anular o voto se alia a outros que se referem ao desejo de insubmissão a poderes, ao comando, à transcendência que sujeitam a massa. Esses que assim resistem, também resistem às disciplinas, na escola, no exército, em casa, no trabalho, ou melhor, resistem na vida que o controle continuo tenta capturar.

Desde que a internet apareceu como rede de redes, rizoma de singularidades, organizações horizontais foram atualizadas, inspiradas pela comunicação de todos para todos, sem centro. Muitos se organizaram de forma mais consistente, criando projetos constituintes. Outros, mesmo com a falta de oportunidade de atuar nesses grupos, usam a internet e fazem resistência do seu jeito: buscam outros canais de informação diferentes das grandes mídias, compartilhando informações em blogs, fóruns, nas redes peer-to-peer, nos mecanismo de publicação aberta, que possibilitam a qualquer um se tornar mídia. Tudo isso cria uma rede de colaboração e parceria, muito diferente da comunicação de uma via das grandes mídias, que apenas perseguem o lucro. Estas, assim perdem sua hegemonia.

domingo, 18 de julho de 2010

as teorias na pesquisa

Ao longo do mestrado, tive contato com pesquisadores da comunicação que têm certos autores fora do campo como a base de seus trabalhos.

Exemplos: Henrique Antoun (que trabalha com Negri e Hardt), Fábio Malini (idem), André Parente (Deleuze), Ivana Bentes (idem); e no ppg da comunicação da Unisinos: Marocco (Foucault), Suzana Kilpp (Deleuze) e Alexandre Rocha (Deleuze, Guattari, Negri e Hardt).

É claro que sou parcial nessa lista; esses são pesquisadores que admiro, também por trabalharem com os autores que são centrais para minha pesquisa. Mas me pergunto por qual razão Negri, Hardt, Deleuze e Guattari são apropriados pelo campo da comunicação (Foucault tem relações estreitas com eles).

Bem, Deleuze escreveu sobre cinema. Guattari criou o conceito de pós-mídia: está lá nas Cartografias do Desejo, nas Três Ecologias e, em um momento e outro, em Caosmose.

Quanto a Negri e Hardt, em sua obra conjunta, eles tratam das mídias em algumas passagens. Em Império e Multidão, eles falam da legitimação do poder global feita pelas mídias hegemônicas; citam os estudos culturais, Debord, Habermas e a escola de Frankfurt. Tratam do hacktivimo, movimentos do software livre e até do indymedia.

Acho que Antoun trabalha com eles, pois pesquisa as resistências, e como estas na contemporaneidade são midiatizadas, relações entre os autores e o campo da comunicação são fáceis de serem feitas. Como já disse em outro post: trabalhar com as resistências leva a estudo de Negri e Hardt, como também de Guattari e Deleuze.

Por fim, ligando resistência, esses autores e a comunicação – cibercultura – gostaria de compartilhar alguns links para arquivos: primeiro a tese de Fabio Malini
ex-orientando de Henrique Antoun. Malini faz uma leitura da obras de Negri, a partir das subjetividades sociais formadas pelos paradigmas de produção. Outra parte de sua tese é dedicada a conexões entre esse tema e a cibercultura.

Deleuze tem dezenas de livros traduzidos no Brasil, muitos pela editora 34. Mas boa parte desse material está disposta no Dossiê Deleuze,
que também tem muita coisa de Guattari. Algumas coisas que estão na web faltam, como o Anti-édipo: livro escrito com Guattari que é a primeira parte de Capitalismo e Esquizofrenia. De Foucault tem o espaço Michel Foucault e o 4shared.

Textos de Negri e Hardt são um pouco mais difíceis. Império e Multidão estão disponíveis em espanhol no último site. Encontrei um link para Commonwealth em inglês. Este é ultima parte de trilogia, as duas anteriores são Multidão e Império. Não tenho mais o link, mas usando torrent talvez seja fácil de encontrar.

É bom lembrar que fazer esse tipo de download é fazer resistência; e compartilhar documentos é distribuir conhecimento e ajudar a fortalecer toda uma rede que se mantém por cooperação.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

as formas de luta na Grécia

O momento difícil da economia grega se alia a um momento político importante: a crise européia, a visibilidade da tomada de poder por países dominantes e instituições supranacionais, como UE, FMI. A atenção dada pela grande mídia à crise do país torna fácil de o observar (é claro que em canais independentes), encarando suas resistências. Não li nada sobre movimentos anarquistas se insurgindo em bloco contra o Estado em outros países – por isso focalizo nesse país. No entanto lutas anarquistas se apresentam mais globais em táticas, que sempre estão presentes nos encontros dos lideres mundiais, como os Black Blocks – o G-20 do Canadá re-afirmou isso. ´

É difícil achar noticias sobre a resistência grega, principalmente aqui no Brasil. A mídia dominante, como sabemos, simplesmente desconhece esse lado da política. Encontro com mais freqüência matérias no CMI
em sua publicação aberta, principalmente nas traduções da ANA – Agência de Notícias Anarquistas – de sites do exterior. Quando tenho tempo dou uma olhada em um blog dedicado às resistências gregas, o From de Greek Streets e na A-infos, que me deixam atualizado.

Em uma tradução da ANA é exposta a repressão que inúmeros grupos e sujeitos estão sofrendo; processos, muitos deles acusações de assalto a bancos, seqüestros. Porém essas acusações são do Estado e da mídia, ou seja, são duvidosas, podem ser uma forma de aniquilar com os movimentos. Certamente são feitas, para destruir qualquer tipo de ação contra a ordem, o Estado, as políticas do poder global.

Em minha análise rápida, a partir de pouco material disponível, percebi três formas de resistência na Grécia: as lutas legitimadas, como as manifestações. A segunda forma concernia a práticas criativas: squats, autogestão, ocupações, expropriações. Por fim o lado suicida, as ações que levam a penas longas, o que comentei no último parágrafo. Digo suicida, pois isso nutre os meios de comunicação, e possibilita uma punição generalizada de todas as outras formas de resistência. Re-afirmo que esse lado suicida pode ser construção do Estado e mídias para levar a morte qualquer tipo de resistência.

No entanto mesmo as duas primeiras formas são duramente reprimidas: nas manifestações a polícia ataca em peso, agredindo e prendendo. Há uma imagem muito interessante em que um grupo armado de paus ou apenas com os punhos parte em direção de um bloco de policiais. Esta tática se assemelha as do Tutte Bianche. Há notícias de prisões nos squats. Como vimos em outro post a ocupação da TV pelo professores foi quase impedida pela policia. Me pergunto se esse controle maciço do Estado não gera manifestações mais violentas como os possíveis assaltos a bancos e seqüestros.

Por fim essas formas não são isoladas, se interpenetram: quem produz os espaços criativos está nas manifestações, e as manifestações envolvem criatividade – como a tática que expus acima. Quanto às resistências que se perdem na ilegalidade, vamos ver o que o tempo nos diz delas.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

sobre a banca de qualificação

Notei que em quase todos os posts sobre pesquisa, estou comentando a banca de qualificação. Como a coisa ainda está quente acho que é importante dizer algumas palavras sobre ela. Não vou entrar no meu tema, em meu objeto de estudo, pois é muito específico; vou falar um pouco sobre a situação – a banca – pois acho que seria mais útil para quem vai passar por isso. Outra coisa: nos textos sobre pesquisa do blog, tento ser o mais superficial possível, pois o blog é dedicado para pessoas que cursam pós (não apenas), e sei que quem está nessa, se já passou do primeiro ano, está cansado. E também para mim o blog é uma fuga da pesquisa, um lugar para eu arejar minha cabeça – por isso o tom ameno e anti-acadêmico deste espaço.

A banca foi escolhida um mês e meio antes. Deixei a escolha nas mãos de meu orientador – confio nele, estamos no mesmo barco, o trabalho de pesquisa é conjunto. A banca formada por pessoas que já conhecia, ajudou e muito, pois a coisa ficou menos formal. Minha apresentação durou vinte minutos. Esse é o tempo mínimo; decidi que a apresentação seria rápida, pois eu fiz quase que um relatório dos conceitos que estou trabalhando, o que poderia se tornar chato se eu me estendesse.

Desde a preparação não tinha gostado do que eu iria apresentar. Parecia um empobrecimento do meu texto. Também foi sugerido para que eu fosse além do texto da qualificação. Fiz isso em parte, pois esperava a banca pra pensar no que fazer com a pesquisa – e principalmente estava muito cansado, usei boa parte do mês entre a entrega do texto e da banca para descansar. Quanto a isso – descansar – acho que merece um post extenso, pois para mim é cada vez mais importante.

Os dois membros falaram e muito. Foi um pouco difícil os ouvir, estava nervoso, estava sendo examinado. Anotei o que pude anotar. Me passaram a palavra e decidi ficar mais em silêncio. Acho que ouvir, ser cauteloso, falar na hora certa, o que já disse em outro post, é muito importante em uma situação como essa; no entanto, se isso vira uma exigência, não posso dizer que seja algo positivo.

A banca trouxe contribuições ricas, algumas coisas ficaram no ar, pois foi tudo muito em excesso, muita informação, difícil de apreender tudo. Bem, mas recapitulando: devo ser mais rigoroso, muita coisa está verde. Alguns conceitos não estão claros, ou correm o risco de serem confundidos com o senso comum. Exemplo: estou trabalhando com o conceito de democracia. Não a democracia do Estado, a democracia que conhecemos, mas democracia especial dos muitos, imanente, que impede a soberania, não excludente, que para mim é atualizada em níveis menores, em certos ambientes midiáticos. Democracia de singularidades que agem em comum, mas que não perdem suas especificidades. O problema é que democracia é conceito naturalizado, que faz parte do senso comum. O discurso de inclusão é corrente na boca de políticos, da mídia. É importante eu escapar disso.

Agora estou vendo o que vou aproveitar. Isso vai ser formalizado na minha próxima reunião de orientação. Infelizmente não vou aproveitar todas as sugestões. Mas como tinha citado em outro post, a banca serve como uma ponta pé na pesquisa. Pensava que tudo estava claro, só que agora vejo que tem muito mais trabalho a ser feito; o saco é recomeçar. Por fim, a qualificação não é bicho de sete cabeças; com um grupo de pessoas com certa afinidade a coisa é tranqüila. Dificilmente alguém não passa pela qualificação. Se trabalha e muito com o orientador, ele não deixaria as coisas a deriva.

Fica a dúvida da validade da banca de qualificação. Em outros programas de pós ela não é mais exigida. No meu caso, para mim teria sido melhor excluir a apresentação; acho que isso é mais formalidade. Uma reunião com a banca, a troca de idéias diretas sobre o futuro da pesquisa, mais algo em formato de texto como sugestões, talvez fosse mais útil. Talvez mais pesquisadores analisando e sugerindo fosse interessante. Ou até mesmo uma análise conjunta com colegas de linha de pesquisa ou mesmo de mestrado e doutorado. A estrutura da academia às vezes pode ser antiquada, certas instituições têm dificuldade em se adaptar às mudanças de paradigmas. Mas todo mundo sabe que muitas cabeças pensam melhor que duas – banca –, três – mais o orientador – ou quatro – mais o cara examinado.

domingo, 11 de julho de 2010

o poder sobre a pesquisa

É interessante a estrutura do mestrado: projeto, entrevista-banca de ingresso, disciplinas, orientação, grupo de pesquisa, qualificação, defesa da dissertação – tudo isso oficial, mas se passa outras coisas nos corredores, no bar, no café, mas isso eu deixo para outro post. O começo dessa parte formal é o projeto inicial, que depois vai sendo filtrado, formatado por todos outros passos do processo. Mas o projeto e quem o fez não podem ser separados; assim o mestrando vai sendo formatado, recuperado aos poucos, com o objetivo de se tornar mestre ou um futuro pesquisador – este último caso mais para quem tiver saco, tempo ou grana para fazer doutorado.

Entrei no mestrado com uma vaga idéia do que queria pesquisar, alguma noção mínima sobre o campo da comunicação e sobre a estrutura do curso. Isso foi há pouco tempo, bem pouco, e já estou me organizando para o exame final: a dissertação. A muito que ser pensado sobre todo o processo: por isso esse blog; ele deveria servir para me ajudar a pensar sobre o que está acontecendo.

Quando eu falo em ser formatado, recuperado, sobrecodificado, não estou usando metáforas fortes. Me sinto desde o início como se houvesse um bloco de vozes que dizem: pense de tal forma, faça isso - ou sendo menos radical: faça uma boa escolha. As disciplinas exemplificam isso. Já no primeiro dia vi que não estava na graduação. Os colegas não eram os mesmos; talvez todos já tivessem uma idéia do que os esperava, que não era brincadeira, que a coisa seria dura.

O corte entre professor e aluno era o mesmo. Diferente a relação entre eles. Sempre me mantive em silêncio em sala de aula, anotando tudo que era dito, prestando atenção em todos os detalhes – como todos os outros. Falava apenas quando pedido; e se você quer se tornar um mestre deve saber falar, e principalmente saber do que se fala. Muito diferente da graduação, na qual você pode falar e ficar na sala quando quiser.

Assim aprendi a ouvir e falar: o primeiro caso envolve respeito com quem fala, o professor. O segundo é um pouco mais complexo, pois se refere ao primeiro e a todo um jogo de postura, entonação; e esse falar é falar na hora certa, da forma certa. Isso é posto também em prática no grupo de pesquisa, e principalmente nas bancas.

“Ser cauteloso”, acho que seria a máxima do mestrado. Ser cauteloso, pois você está sendo examinado. Cada disciplina envolveu um texto final, um artigo. Um artigo não é crônica, ensaio, opinião. Você pode falar de qualquer coisa, mas da forma certa; ou melhor, você pode falar qualquer coisa que diga respeito ao seu campo de estudos. Foi fácil manter certa postura, não sei por qual razão. Talvez uma facilidade em ser assimilado; pois mesmo no trabalho de pesquisa até a banca de qualificação não foi difícil fazer as coisas como elas "devem" ser feitas.

Semana passada, a banca de qualificação foi mais um passo no meu aprendizado: ouvi receoso o que a banca disse, falei pouco, o necessário. Só que ali a coisa ficou um pouco mais complicada, acho: a exigência foi maior. Até o momento tive uma certa liberdade. A banca pediu mais rigor. Encontrei um amigo na saída da apresentação, ele me disse: “isso serve como um pontapé para a pesquisa”; "para" ou "na" pesquisa, veremos.

mais uma ocupação de canal de TV na Grécia

Estou organizando material sobre as manifestações libertárias na Grécia. Algumas coisas que estou postando aqui no blog já esfriaram, deixaram de ser noticia; no entanto, como esse tipo de informação não chega a nós pela grande mídia, considero isso válido. Poderiam me perguntar por qual razão estou dando atenção à política grega; respondo que as manifestações gregas ensinam que há possibilidade de determinados tipos de ações. Que a multidão é criativa, e resiste. Também, ser solidário com as questões da Grécia é ir de encontro a inimigo comum: a ordem mundial. O FMI e os Estados-nação dominantes impõem suas políticas não apenas a Grécia, mas a todo o mundo.

Segue abaixo vídeo de ocupação de canal de TV grego por grupo anarquista, em 14 de abril, durante noticiário noturno. O grupo era formado por 70 pessoas e objetivava se manifestar contra a prisão de seis camaradas acusados de terrorismo.


sábado, 10 de julho de 2010

ocupação de TV na Grécia

A notícia abaixo se refere às manifestações do povo grego contra as políticas impostas pelo governo e pelo FMI. O texto é sobre fato ocorrido no início de maio. Sei que não é mais "novidade"; mas trago esse texto para expor a criatividade do povo grego: ocupações de emissoras de rádio e TV, de prédios, ataques a bancos, e as greves gerais são constantes no país nos últimos meses. A tradução (livre) é minha de original que se encontra aqui.

Professores ocupam estação de TV estatal

No início de maio enquanto programa de notícias estava no ar, dezenas de professores entraram na sede da Estação de TV Estatal (ERT) em Atenas. Após o noticiário, o canal tinha planejado uma entrevista com o ministro da educação. Os professores exigiram sua presença no estúdio durante a entrevista do ministro, além da possibilidade de se exporem.

Enquanto as notícias estavam sendo apresentadas, barulhos e discussões foram ouvidos nos bastidores e a partir daí o programa foi suspenso. A polícia invadiu o prédio, atacando os professores.

Após negociações e mais violência policial, os manifestantes exigiram leitura de declaração ao vivo no canal de TV (veja o vídeo abaixo). Os professores são membros da União Nacional de Professores; sua declaração vai de encontro ao FMI e convida a todos (o povo grego) a participarem da greve geral (que ocorreu) em cinco de maio. Eles também criticam a nova lei do ministério da educação que irá reduzir a qualidade da educação pública gratuita e deixará milhares de professores desempregados.

“[…] Nós decidimos vir aqui hoje, nos estúdios da estação de TV do governo, por duas razões; a primeira: por seis meses a grande mídia ficou em silêncio em relação às medidas econômicas do governo. Segundo, pois nós queremos quebrar o silêncio do ministério da educação sobre o pacote de leis que será votado e que destruirá a educação pública. Nós fomos recebidos dentro e fora do estúdio por um time de policiais prontos para nos agredir. Nós condenamos o ministério da educação e este canal de TV por essa agressão: vocês vêem que há evidências de violência contra nós. O governo impôs o programa de estabilidade, que enclausura mais de trinta estudantes em cada sala de aula e demite milhares de educadores. Tudo isso é arcaico e nos remete há outro tempo; vai de encontro com as necessidades e direitos da sociedade grega. Agride trabalhadores, estudantes e professores. O governo nos impõe a pagar pelo custo da educação. Após o pacote de leis nós seremos descartados. Pensávamos que éramos minoria, mas no tornamos maioria após a “ajuda” do FMI que resultará no aumento da pobreza e na demissão de milhares de trabalhadores. Chamamos todos para as ruas para bloquear as medidas econômicas, dar um pé na bunda do FMI e de todos aqueles que estão por trás de tudo isso. [...]”


sexta-feira, 9 de julho de 2010

por que fazer mestrado?

Bem, a idéia do blog surgiu de um desejo de compartilhar informações com quem está em situação parecida com a minha: cursando programa de pós-graduação, ou quem quer fazer mestrado. O que realmente me motivou a criar o blog, foi o trabalho de algumas pessoas que fizeram o mesmo, compartilharam na internet, textos, fichas de leitura, o que me ajudou, e muito, na minha pesquisa.

O objetivo do blog, como diz o título, no momento, é noticiar resistências, principalmente as contemporâneas, e expor meu trajeto no mestrado – as “outras coisas” irão surgindo com o tempo. A primeira postagem, a anterior, foi sobre a política das ruas que está acontecendo na Grécia; já neste post vou falar um pouco sobre a minha pesquisa.

Gostaria de falar sobre a razão de eu ter me metido nessa história de mestrado. Há uma exigência crescente na sociedade pós-moderna. A gente trabalha cada vez mais, estuda cada vez mais. Estamos sempre trabalhando, nos aperfeiçoando. somos disciplinados continuamente, controlados. O motivo mais importante é a possibilidade de conseguir um emprego melhor. Deixando essa obviedade de lado, eu me meti nessa para trabalhar com certos autores, que para mim são muito importantes, não apenas para o meu trajeto como pesquisador, mas também para minha vida.

Esses autores – Antonio Negri e Michael Hardt – têm relação com a vida muito especial, buscam mapear formas de resistência, subjetivas, políticas, econômicas, sociais, etc. Trabalhando com eles, me alio a seu tipo de resistência, e as resistências que eles se aliaram: a multidão.

Considero-os importantes para minha carreira de pesquisador, pois será difícil trabalhar com outros teóricos, possivelmente minhas próximas pesquisas serão condicionadas por eles. Importantes para minha vida, pois em seu estudo muita coisa mudou na forma como encaro o mundo.

Pela centralidade de Negri e Hardt talvez meu desejo se concretizasse se eu estivesse fazendo uma pesquisa puramente teórica. Cogitei essa possibilidade, no entanto, pela natureza do programa que me inscrevi, o da comunicação da Unisinos, fui levado a ter como objeto de estudo, também processos midiáticos.

Os apaixonados pelo campo da comunicação, ao lerem isso possivelmente ficarão indignados, mas isso não deveria ser tão assustador assim: os pesquisadores do campo da comunicação que tratam das resistências – midiáticas – em boa parte usam como referência Negri e Hardt. E como o espaço deste blog não é acadêmico, e posso opinar, eu diria que qualquer pesquisa que trate da potência da vida, da política das ruas, não dos gabinetes, passaria por apropriações de Negri e Hardt, e de outros aliados seus como Deleuze-Guattari e Foucault.

Considerando a impossibilidade de pesquisa centrada nesses teóricos, decidi ter como objeto de estudo resistências midiatizadas. Não entrando diretamente no meu objeto, não estou a fim de falar agora sobre ele, o objetivo da pesquisa seria algo como: mapear as apropriações midiáticas feitas por grupos de resistência contemporâneos, como eles criam lógicas que diferem das lógicas das grandes mídias. Negri e Hardt me possibilitam a conceituação das resistências, a Multidão.

Passei por inúmeros testes, exames, como as disciplinas, a orientação, e esta semana a banca de qualificação. E minha sugestão de agenciar com esses autores foi aceita – ou seja, estou mais integrado no campo do que penso. Finalizo aqui essas palavras sobre um de meus objetivos no mestrado, tenho outros é claro, falo sobre eles depois.