ORGANIZAÇÃO
DA METODOLOGIA PARA O MAPEAMENTO DO DEVIR REVOLUCIONÁRIO DOS MOVIMENTOS GLOBAIS
DE INDIGNAÇÃO – PARTE ESCRITA, ROTEIRO, DE APRESENTAÇÃO EM SEMINÁRIO
A pesquisa centra-se na
política contemporânea em seu duplo movimento: 1. a valorização da biopolítica
(pós-Foucault), a política da multidão (Negri), os processos de singularização
(Guattari), as lutas moleculares (Deleuze e Guattari). 2. a compreensão e
crítica do biopoder (Foucault e pós-Foucault): biopoder é o poder exterior a
multidão, do Império (Negri), em sua forma de controle (Deleuze e pós-Deleuze),
o poder expresso até em micro relações.
Premissa, ponto de
partida da pesquisa: as lutas biopolíticas produzem o mundo; e o biopoder se
apropria da produção; mais, se reestrutura para bloquear a potência que vem
desde baixo. Processo de desterritorialização e de reterritorialização,
conflitos entre o molecular (resistência) e molar (poder).
Duas questões quanto ao
poder, acho que devem ser mapeadas mesmo que não sejam o centro do trabalho: 1.
a molarização dos fluxos moleculares, em parte desejada pelas minorias; remanejamento
do poder. ex. aceitação de demandas da multidão. Reformas no sistema político a
partir das lutas. 2. molecularização molar, a serviço do poder. No contexto pós
moderno, há algo como uma flexiblização das classificações, das identidades.
ex. precarização, algo entre trabalho e desemprego.
Me proponho a mapear as
lutas da multidão: a molecularização que diz respeito à potência, mesmo tornar
a produção do poder em potência; como isso vai sendo apropriado, usado: ex. subjetividades
desterritorializadas: fim do enquadramento.
Produção imaterial, intelectual: empoderamento, aumento do saber. Queda
das fronteiras geopolíticas: democracia global. Redes disseminadas: forma da multidão.
Talvez, o movimento de remanejamento do
poder, a passagem do molecular ao molar só possa ser compreendido após o devir
das lutas. Talvez seja possível apenas, pesquisar os processos de
singularização da multidão: a fuga dos códigos dominantes.
Aí surge o Objeto,
recorte da multidão: lutas contra a democracia representativa e o capitalismo;
movimentos de indignação global (dos indignados espanhóis até os Occupy).
Creio que o mapeamento
de um conceito abrange a potência do objeto de pesquisa: devir revolucionário.
Devir, o que está acontecendo, não o futuro da revolução. A riqueza em si do
movimento, atual. Mesmo os desejos de uma nova realidade, já são atuais, e são
potência. Esse devir arrasta blocos de devir, e eu penso dessa forma produzindo
uma multiplicidade, fazendo rizoma.
Devir é acontecimento,
processo, experimentação, que passam sujeitos, grupos, mundo acadêmico, mídias
corporativas, etc, qualquer coisa. Devir
não diz respeito aos estados duros, fixos, modelos dominantes, são linhas de
fuga do poder.
Devir, como disse, acontece
em blocos: ex. Um devir nômade não
se refere apenas ao deslocamento físico, pode dizer respeito à experimentação
de desterritorialização, mental, social, existencial. Linha de fuga frente ao
sedentarismo que marca a sociedade centrada no aparelho de Estado. Isso poderia
envolver um devir-drogado:
experimentação da narcose, sem o uso, ou com: o drogado como sujeito
desterritorializado mentalmente. Um
devir artístico: que não tem na da a ver com a arte como estado, mas como
campo de experimentações perceptivas. Esse bloco de devires afetou a filosofia,
o devir nômade da filosofia a partir da obra de Deleuze. Antes com os Beatnicks, Rimbaud, o devir
nômade da arte. O nômade como estado aparece como impotência para as
significações dominantes: as levas de imigração, os ciganos, todos
marginalizados. No entanto, permitem o devir menor para todo o social.
Importante pensar a
multidão como campo de experimentação de devires, que pode se tornar um projeto
político molar. Pensar não o que é, construindo identidades; mas como funciona.
Sobre o devir
revolucionário da multidão, primeiro bloco de devires mapeados: 1. devir-democracia:
linha de fuga da representativa; devir pois não há formas e modelos prontos a
serem resgatados na história; isso é experimentado em territórios singulares horizontais,
descentrados, autônomos; fuga da dicotomia dominantes-dominados. Vistos nas
mídias, assembleias, organização dos grupos, acampadas. 2. devir-midiático: novas mídias produzidas pelo
movimento não capturadas; as apropriações das mídias corporativas, como
facebook, youtube, etc, em usos diferenciais em relação aos usos dominantes. Outro
bloco de devires, considerando a tomada das ruas (os acontecimentos da multidão),
devir revolução da cidade, cidade desterritorializada; devir-marginal da
multidão (os muitos presos); devir-violência (contra o patrimônio),
devir-improdutivo (greves). Esses devires traçam uma linha transversal entre o
dualismo legalidade-ilegalidade. Note
que o devir é revolucionário, pois escapa das significações e códigos
dominantes. Põe abaixo a ordem.
Um outro devir, importante de ser mapeado é o
multidão das mídias de massa: afetações
das multidão nessas mídias. Mesmo legitimando o poder, elas não ficam ilesas da
expressão da multidão.
Outros devires, as
produções dos movimentos, como fuga das significações dominantes atualizadas
pelo poder: 1. Produção de subjetividades: anonyma; indignada, okupa X subjetividade dominante, enquadrada. 2. Modos
de vida: okupas, devir pobre x vida burguesa. 3. Relações: parceria X não de
poder. 4. Desejos em devir: de revolução X desejo de repressão.
Por fim, importante
repensar o conceito de molar e molecular, a molarização e a molecularização da
potência: o molar nas minorias, os processos mais consistentes: assembleias,
acampadas, grupos, teóricos, acontecimentos. E seu molecular, o minoritário do
movimento: o menos expressivo. Pra que
serve esse mapeamento: principalmente para dar expressividade ao minoritário,
tornar visível. No caso, creio que o desejo de revolução não se limita aos
indignados, mas a todo o povo. Amplia-se assim o território: indignados são todos.
O movimento deve atualizar o desejo de revolução, para se tornar mais potente. Já
o molar, do movimento, deve ser pensado para ser percebido o que vai ganhando
expressão e como isso rompe com possíveis centros de poder.
2.
QUESTÕES
EXISTENCIAIS DA PESQUISA:
Pergunta 1: como tornar
a pesquisa uma pesquisa indignada, anonyma, de okupa, não como devir mas estado?
A pesquisa já permite um devir okupa, anonymo, indignado do campo de saber, ou
do ambiente institucional.
Pergunta 2. Como
produzir pesquisa singular, algo que não redunde o que já foi feito? Considerando o excesso de produção textual
sobre o tema. Até agora: estou construindo a história dos acontecimentos
principais, pensando o devir revolucionário, o molar e molecular do movimento,
sua resistência ao poder. O diferencial talvez se dê aí, pensando a multidão a partir
da obra de Deleuze.
Possibilidades: Abrir a
tese para o social, primeiro pela linguagem. Usar o ensaio como potência,
linguagem mais acessível. Segundo: creio que o uso da cartografia, é importante
pela abrangência: não se limita a um campo ou objetos; qualquer um pode usar
para mapear qualquer coisa. Terceiro: despessoalizar
a pesquisa, deixar passar os fluxos da multidão, fazer rizoma. Não criação, mas
aliança, teórica e política. Não pensar na pesquisa como algo referente a um
sujeito, criador: remix (Debord), antropofagia (arte e filosofia brasileiras),
canibalização de estilo (o lixo pós moderno como potência). Aqui entra outra
questão: fazer rizoma, abrindo o texto, traçando suas linhas de fuga,
aumentando o território: ligar o tema com arte, outras formas de resistência.
Também para deixar o texto mais leve. Produzir pesquisa de superfície;
profundidade da superfície.
3 – DESCIDA A CAMPO
Não gosto da expressão,
de descida ao campo. O mundo, prática, fica em posição abaixo da pesquisa,
teoria. Objeto também é péssima expressão; o mundo como objeto sujeitado a uma
pesquisa, ou pesquisador. Também ir a campo, significa uma exterioridade, e não
há fora do mundo. Nota-se aqui a reprodução do poder, mesmo em micro relações,
como o pensamento, a fala.
No caso da minha
pesquisa, a multidão e o poder, não há fora. Poder e potência são afirmados em
tudo. Não tem como não experimentar o mundo. E como digo: produzo para o movimento, para
multidão. Se vivo a pesquisa acadêmica, vivo assim o movimento. E meu coração
está com o movimento.
O que significa ir a
campo para a pesquisa do movimento? 1. Pesquisa bibliográfica: há uma produção
mesmo em formato de livro extensa sobre. Também muitos teóricos, fazem parte,
assim dicotomia do tipo, teoria e prática não faz sentido. 2. Pesquisa dos produtos de web: sites,
wikis, blogs, perfis de facebook, e de twiter, vídeos do youtube,
streaming. 3. Contato com sujeitos: nas
okupas, nas manifestações, via e-mail. 4. Pesquisa da mídia de massa.
Sobre análise das manifestações:
off line e on line são complementares: on line: pelos inúmeros pontos de vista;
pode ser feito após as demos, deve ser feito depois. Of line viver o
acontecimento. Estar em uma assembleia podendo ser preso; estar em uma praça em
situação de risco, isso marca mais do que estar na frente do computador. Por
fim importante no contato com os sujeitos do movimento: contatar não como
pesquisador, sujeito de fora, acima do suposto objeto.