sexta-feira, 29 de junho de 2018

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O texto é um exercício de esquizoanálise, ou seja, cartografia, transversalidade. O atravessamento não está só nos temas, mas também na narrativa, que é filosófica, científica, literária. Na verdade, não é filosofia nem ciência, é arte, e não é arte é comedicidade, riso de satã. Ficaria feliz se fosse lido como uma ficção, uma mentira, algo diabólico, enganador. O texto pensa em N mundos, N tempos-espaços, devires, a partir da percepção molecular e critica o bom senso que se centra em um único mundo, sustenta a ciência, insiste que Deus não morreu, cria uma narrativa negativa referente ao satanismo. Os temas e conceitos presentes são: acontecimento, maio de 68, anarquismo, guerrilha, drogas, sonhos, delírio, família, gêneros, sexualidade, corpo, queer, cultura pop, arte, mitologia grega, guerra, Estado, orientalismo, ecologia, história, humanismo, psicanálise, minorias, palavras de ordem, cidade, juventude, satanismo, cristianismo, bruxaria, shamanismo. Ele não foi pensado previamente, não sabia o que ia acontecer, ele foi se criando e tomando forma; mas como digo: não é espontâneo e talvez tenha de certa forma se criado sozinho, melhor, pelas legiões que pertenço. Os símbolos e a narrativa cristãos presentes se referem à comedicidade que acompanha meu trabalho. Falar em Deus, Cristo, em demônios é uma piada, que não tem como objetivo ferir a aqueles que ainda acreditam em Deus, já que são poucos. Uso esses símbolos para compor a narrativa, a fábula, a história. Porém, busco dar novos delineamentos para o conceito de demônio. O demoníaco se apresenta como crítica ao senso comum e o bom senso. O demônio no texto não é um ser de outro mundo, não se dicotomiza com o Deus de outro mundo, ele é um agente, um devir, materialista, ou seja, deste mundo.  


O acontecimento. A impossibilidade de se entender o acontecimento quando está acontecendo. Os sentidos do acontecimento necessitam de tempo, por isso a arqueologia e a genealogia são mais fáceis que a cartografia. Além disso, quando se dá o sentido pode não ser realmente entendido, já que é difícil notar o molecular. A pergunta: “o que realmente aconteceu?” pode dar medo já que sabemos, de uma forma ou outra, que forças subterrâneas estão presentes no acontecimento e, mais, que elas podem criar o acontecimento. O devir, monstruoso, demoníaco assusta, ele mostra o caos, o qual rege o mundo, e por segurança nos prendemos no obscurantismo religioso cristão ou na ciência. O satanismo é obscuro, mas outro tipo de obscuridade. O cristianismo é baseado nas paixões tristes, ninguém pode ser feliz, todos devem purgar seus pecados e punir os pecados dos outros, tudo é pecado. O satanismo é erótico, é Eros, erotiza até mesmo a morte, Thanatos. Para os satânicos Eros e Thanatos estão sempre em núpcias, núpcias demoníacas; os devires são as núpcias demoníaca, não a filiação, o pai e o filho, Deus e Cristo. Satã é o filho rebelde, não há um Deus do inferno, e ele não é três, não é o pai, o espírito santo e o filho abandonado. Satã é o filho rebelado. Quando a criança coloca o dedo dentro do nariz na mesa na hora da oração, é a atualização do demoníaco que sempre esteve presente nela. O que realmente aconteceu em 68? O que aconteceu em 2001, o que aconteceu em 2011 e 2013. Deleuze, Negri e o coletivo da Uni Nômade viveram os acontecimentos e os atualizaram no campo do saber. O acontecimento necessita da vivência dele, de uma subjetividade molecularizada a partir do contato com o caos, de uma percepção demoníaca, da vitória do terceiro olho frente ao grande irmão. A longa preparação a partir da vivência dos acontecimentos, do contato com o caos possibilita então rastrear, tatear o que não é visto; e a ficção, quando se ficciona o acontecimento, depois de atualizada pelo saber pode muito bem se tornar mais interessante que a dita “narrativa do real”. Não era ficção, era o registro da temporada no inferno, a escrita de Satã; a ficção assim se revela como a outra face, a outra cabeça, já que somos monstros, temos duas cabeças que não se dicotomizam. Duas cabeças que são N cabeças, dragões de múltiplas cabeças; múltiplas cabeças e uma só é a cabeça de Deus, da ciência ou do bom cidadão. Temos múltiplas cabeças, mas pensamos que só temos uma. Vivemos em muitos mundos, mas só percebemos um. Nesse mundo há o material, o céu e o inferno. Mas o mundo de Satã são N mundos, os N mundos, a morada de Satã, e ele, como disse, não é um, mas bandos de bandos, legiões de legiões, multiplicidades que não se esgotam nunca; e a multiplicidade, o devir, a soma, a conjunção, tudo isso é reduzido pelo bom senso. Dizem sempre: eu sou eu, eu sou aquele, eu sou um organismo, um sujeito individuado – palavras de ordem daqueles que não entendem uma frase simples: somos legião! Klaus Kinski entrava no personagem e demorava muito tempo para sair dele. Ficou um ano agindo como se fosse Cristo. Se Cristo fosse Kinski, não teríamos entrado na era cristã, teríamos ficado no nosso tempo-espaço de origem, o caos, a anarquia, o inferno. As forças da vida são primeiras como diz Negri, e o único universal é o devir como diz Deleuze. O inferno, o caos, é o início, a era imposta pelos cristãos é a fotografia, o impedimento do caos. A guerra santa, a inquisição, o nazismo, a guerra que atravessa a história, os Estados Unidos de Bush, não são demoníacos, são cristãos, são demoníacos apenas a partir da dicotomização cristã. Vlad Tepesh se torna potente quando larga a violência cristã, e vive (morto) pelo amor. O algo de demoníaco na paixão triste, na violência cristã, é o riso sarcástico frente a ela. Satã pode até influenciar na guerra, ajudar que ela seja realizada, pode estar nas costas dos reis, papas, imperadores, inquisidores, das massas os condicionando para a guerra, mas ele faz isso para mostrar ao mundo a sujeira cristã e humana. Mostra que o homem é sujo, que mata os seus, mata qualquer um por poder, por matar. Os avanços científicos, a ciência, o campo do saber, a tecnologia – tão cultuados, o que nos ajudou a sair da escuridão do medievo – só aconteceram já que necessitávamos de instrumentos para destruir reinados e nações. A ciência nasce como paixão triste e se desenvolve como paixão triste. A tecnologia digital e a internet foram criadas pelas mentes maravilhosas de cientistas do Estado, e o Estado faz a guerra. A Guerra Fria criou a internet. A negação da tecnologia remete a um estado natural, de “boa” selvageria, e chamam-na de apocalíptica. Sim, é, mas nos termos cristãos, é o apocalipse de João, a danação, os sete anos de luta que nos levará de volta ao manto do nazareno – porém, o manto do nazareno na ótica satânica é o objeto de vitória de Satã. O ludismo não é a boa selvageria, nem o desejo de retorno a terra sagrada, não é arcaísmo, mas desejo de cair fora, de menos, menos consumo, menos guerra, não é a simplicidade, mas a complexidade de vidas que negam a morte e lutam pela vida. Alex SuperTramp tenta sozinho e morre. Os Sadhus lutam em bandos e estão vivos, mesmo que o Kumbh Mela seja espetáculo. Punks estão nas ruas vivendo como ratos. A tecnologia é usada pelos hakers contra os Estados. Os grandes criadores da tecnologia digital eram filhos da Era de Aquários, aqueles que amavam a natureza, a qual foi morta; eles choravam pela morte de Pachamama. Não há retorno à natureza, ela está aqui em nós, já que somos animais. Amar a natureza é amar uma das cabeças presentes em todos. Os índios morreram já que não queriam a morte cristã e muito menos a civilização. Morreram, mas estão em nós, por isso todos somos shamãs. Todos somos Legião, e ela é composta por animais, tecnologia, homens, em ambiente múltiplos, e o tempo dessa legião, são N tempos, ou seja, corpos sem órgãos habitando a virtualidade temporal. O terceiro olho é a tecnologia que possibilita vislumbrar tudo isso, e após a percepção...bem, isso permite que vivamos mais facilmente em outro, outros mundos, sempre presentes. Quando ele, o terceiro olho, é aberto, sabemos que a palavra de ordem: “eu sou alguém que vive em determinado espaço e tempo”, é uma piada. Satã estava presente quando essa frase foi criada, ele não só ri dos humanos apegados ao senso comum, ele o cria, cria o senso comum para contemplar depois esse apego. Os humanos, como eles vivem, suas crenças são o objeto de riso de Satã. A guerra como disse é objeto de riso de Satã. Sim, eles se matam, matam a si mesmos, e dizem que se amam. “Amai-vos uns aos outros se odiando”, Satã não escreveu essa frase, mas a revelou, tornou-a visível. A loucura de Nero, por ser loucura, não era apenas um reflexo do satanismo cristão, ela era erótica, Roma queimava e ele tocava violino. A loucura de Calígula também era erótica. O desejo de poder pode ser algo demoníaco, desejar estar acima de todos e destruir todos já que todos são assassinos. O humanismo é falso e tem que ser re conceituado. Lutar pela vida de todos é uma falácia. Matar para punir, matar em nome da lei, da lei natural e da lei dos homens, isso é parte da sujeira do cristianismo. Mas matar por matar, sabendo que quem é morto é alguém já morto, alguém que ama a morte, não matar para punir nem por vingança, mas usar esse corpo para produzir um acontecimento... isso é a morte como uma bela arte. Os conspiradores, em nome de boas causas, eram obrigados a matar em nome da vida, e esse tipo de assassinato é diferente do assassinato do Estado. Não há diferenças de natureza entre os dois tipos de assassinato, mas extensivamente há uma diferença, de grau, que torna louvável o assassinato pela causa. É impossível não usar as armas do inimigo, já que o homem é o inimigo, e todos somos homens. O suicídio é considerado como algo negativo, já que todos são mentirosos, falsos, sabem que matam, que cometem a morte baseada na paixão triste; e o suicídio é uma morte, um assassinato honrável, o suicida mata a si mesmo não os outros – sim, os homens odeiam coisas simples como dignidade e honra. O homem bomba mata os outros para voltar ao bom mundo, nega esse mundo e os que vivem nele. O cristão comete sua sujeira em vida, se arrepende e volta para o bom mundo. Isso permite com que o mundo seja o que é: a naturalização da guerra constante, do ódio; eles podem fazer de tudo já que se arrependem depois. Satã não é ódio, mas o riso a partir da contemplação do ódio. O cientista não ri, ele não é satânico, a arte ri, ela é satânica, a ficção é um tipo de piada, piada satânica. A ficção é a mentira, a falsidade, mas não como paixões tristes, não existem para enganar e matar, isso faz a ciência, que cria a guerra. Usam Deleuze como base da ciência, mas negam o mais importante em sua obra: o riso de satã. Cristianizam Deleuze, já que eles não dançam, os cientistas nunca dançam, eles tem o cú de ferro, estão sempre sentados. Deleuze era uma bailarina, fazia um balé sem palco italiano, sem a dor da estratificação do corpo, a destruição do corpo para manter a posição rígida, isso faz o cientista sentado, vendo um foco mínimo de luz. Os nazistas estratificavam o corpo ariano, criaram a postura perfeita, a acentuação do corpo dos sujeitos das legiões romanas. O balé estratifica o corpo feminino da mesma forma que a militarização estratifica o corpo do homem. O homem da ciência foi quem criou esses corpos, e os românticos, sendo Deleuze um deles, dançam um tipo de dança diferente, a dança de Pan, de Dionísio e sua Bacantes, das bruxas nuas na floresta. Nero estava dançando ou tocando violino quando Roma queimava? A dança de Calígula fazia os legionários rirem, já que eles desejavam outra relação com o corpo. Estratificar Deleuze, crer que Negri é um filósofo do Estado... Os anarquistas acreditam em Negri e Deleuze, e eles os sensualizam já que acreditam na vida. Os anarquistas percebem exatamente a vida em Negri e Deleuze. A percepção anarquista é mais importante que a obra dos dois. Em termos cristãos é uma blasfêmia, uma heresia o que os acadêmicos fazem com Deleuze e Guattari. Eles não ouvem a música de Mil Platôs já que não dançam. Como criar para si um Corpo sem Órgãos, des estratificar o corpo, abrir o terceiro olho, fugir do grande irmão? Como sentir as moléculas do corpo, sentir a superfície da pele a considerando como o mais profundo? A pele dele ou dela não como parte de um objeto, o sexo objetificado, que imita o copular dos pets, mas uma das linhas mais importantes do corpo amoroso. O Corpo sem Órgãos é amor, é o amor, e quando ele se resume a dois, isso é uma palavra de ordem do grande irmão, que odeia o amor. As legiões, os possíveis, que nos habitam e se tocam em um gesto simples: colocar as mãos dela em meu coração, sabendo que o coração é só uma metáfora. Baudelaire assassinou o próprio pai inúmeras vezes em mesas de restaurantes para rir de todos. Sim, eu sou um parricida ele dizia, e todos ficavam horrorizados. Ele fazia isso para Satã rir, e Baudelaire já era Satã. Os ovários são laicos, mas o cú é satânico. Rimbaud amava o cú de Verlaine, e a poesia sobre o cú de Verlaine era uma piada satânica; piada matadora é o nome de uma banda inglesa, filha de satã. Palhaços assassinos, como os vocalistas das bandas Alien Sex Fiend e Cinema Strange; os dois personagens mais engraçados do humor atual, um bebê e um alienígena são assassinos. O riso e o assassinato conjugados compõem uma núpcia demoníaca: palhaço assassino, aquele que faz a Killing Joke. O homem da guerra não ri já que não caga, ele é sério já que tem o cú de ferro, dama de ferro, como o cientista. O cientista bebe tanto, não por que é um romântico, mas exatamente para poder cagar e rir. Quando ele bebe, ele consegue, mas seu alcoolismo se origina da paixão triste, só consegue ser feliz na tristeza. Bukowski não bebia, o estado alcoolizado era seu estado natural. O vinho como sangue de Cristo é a imposição cristã, o vinho como sangue de qualquer um diz respeito ao assassinato satânico que é uma piada: matar um zumbi, um morto, alguém que ama a morte. Mac Beth foi iludido pelas bruxas, elas que fizeram ele se destruir; ele amava tanto a si mesmo, o poder, merecia ser destruído. As bruxas são os canais, os portais dos súcubos. As bruxas estão sempre grávidas trazendo ao mundo seres satânicos. Os românticos são filhos das bruxas, que são filhas de Satã. O homem comum é filho da puta, é Édipo. Jocasta se mata já que todos iriam saber quem ela realmente era, uma puta. E o bom cidadão deseja isso, uma casa, um território mínimo, no qual ele e ela são os reis sempre. O teatro de Édipo é uma piada satânica, satã ri de Édipo, Deleuze como um demônio nos presenteou com esse riso, o riso do complexo de Édipo. Mas quando se tira as razões pessoais de Édipo e ele vira um agente político percebemos a potência da vida: não desposar a mãe, mas simplesmente matar o pai. Aliás, matar também a mãe, matar o rei e a rainha, destruir o estado e fazer a anarquia, o projeto da anarquia. “Anarquia como projeto, caos projetado”, conjunção de linhas de naturezas diferentes, núpcias demoníacas, frutos do riso de Satã. Para Baudelaire suas paixões eram as prostitutas já que elas são dignas. Indigna é aquela que dá o corpo ao homem para ser respeitada pela sociedade e nega que é uma puta. A puta deixa claro que é uma puta, a esposa esconde de todos que é uma puta. A puta satânica, aquela que ri da sociedade, a puta cristã, aquela que peca e chora ao se ver no espelho. No mundo infernal não há putas, já que todos que o habitam não tem corpo, não possuem corpos, são linhas de Corpos sem Órgãos e ninguém é dono de um Corpo sem Órgãos. O presidiário é uma puta, o corpo dele não é mais dele após a primeira noite na prisão. As leis, a moral, colam a culpa e a vergonha no presidiário, mas se ele não é moralista é alguém louvável. O sexo livre era uma das marcas da era de Eros, e o sexo livre é algo satânico: a importância do comunismo do corpo contra o individualismo capitalista. Por isso, que os Estados comunistas (mesmo os apenas desejados) não entenderam nada do comunismo, o tornar comum, pensavam que a vida se reduzia a economia e política. O comunismo do corpo é micro político. Negri radicalizou o conceito de comum; o nosso comum se realiza quando somos legião; na era de Eros o sexo livre era feito por legiões em leitos que eram Corpos sem Órgãos. A – Quem é você? B – Eu sou Ninguém. A – Não eu perguntei como você se chama. B – Eu me chamo Ninguém, sou Ninguém. A nobreza punk, ser um punk um, qualquer um, ser Ninguém. Punks eram assim chamados os que eram currados na prisão. A dignidade dos punks. Eu sou uma puta mexicana barata. A despersonalização é demoníaca, e nesse caso, no caso do punk, é uma piada. Talvez por isso que o punk tenha sido principalmente inglês, já que eles têm esse humor peculiar, riem facilmente de si mesmos. Saber que se é uma piada, que a vida de bom cidadão é uma piada: nobreza dos punks. Lars Von Trier fez isso em Idiotern, rindo da boa democracia escandinava que não garantia muita coisa. Os Black Metals escandinavos queimavam igrejas, eram violentos, não conseguiam rir, muitos eram fascistas. Eles desempenhavam bem o papel de cristãos. O bom senso diz que uma meia é uma boceta, mas o louco diz que uma meia é uma rede de bocetas – isso é uma piada satânica. O cú da mulher para o bom senso é o cú do melhor amigo, ou do filho, mas para o presidente Schreber o cú é o sol iluminado. O terceiro olho para ele é o cú. Glorificado cú, cú sagrado, consagrado, cú satânico. A virgem Maria tinha um cú. Sim, ela o dava sempre, mas como só dava o cú permaneceu virgem; depois ela virou Maria Madalena, mas no inter meio ela gerou Cristo. Cristo foi crucificado pela própria vontade ao saber que mamãe dava o cú. O filho ouve a mãe dando o cú e pensa que ela está orando, então ele começa a orar e passa a ter doces sonhos com um cú. “Deus nasceu da cloaca do homem” como diz Artaud. O ciclo anal dos queers é o ciclo que rege a lua. O queer não tem mãe nem pai, tem apenas um cú. O cú para os queers, para o monstro, obviamente não é edipinizado. A mulher, o índio, o oriental, o gay sempre foram vistos como agentes perigosos, demoníacos. Shamãs da América latina, do oriente, religiosos negros, mulheres bruxas, para a mentalidade dominante, deveriam ser destruídos por serem diferentes, ou seja, demoníacos. Chamam a mulher possuída de neurótica, mas ela não é neurótica está sim possuída, ela é demoníaca. O demônio não é homem nem mulher, mas algo presente em certos seres. O demônio é devir, ele pode ser uma tempestade, uma bruxa, um artista. O queer é o que de mais demoníaco existia até que queer virasse moda, como virou a cartografia, a transversalidade, as cores do mundo. A mulher se torna homem e deixa de ser bruxa, mas algo de sua bruxaria está presente nos homens, em todos. Quando um fora é capturado, é tornado dentro, o fora nos habita, é o fora em nós. Esquizo análise (ANALlise) é a louca análise, análise dos loucos, que são videntes, sobre a sociedade. Psico análise analisa os loucos, tentando os tornar racionais. O poder vê o caos e tenta o destruir, mas não sabe que a destruição é filha do caos, assim age em nome do caos. A ciência tenta regrar o caos, ou seja, tem uma relação com o caos, e na relação com o caos, ele, o caos, fica presente na ciência. Não há como fugir do caos. O caos da mente de um bebê, da mente de um primata, da mente de uma serpente. A máquina criada pelo homem que é caótico é caótica, tem algo de caos nela. Por isso, todos temem que a máquina irá destruir o homem. A fuga do caos criou a sociedade moderna por uma paixão triste, um ódio de algo em si mesmo, o caos. O homem se olha no espelho, e odeia algo que vê: o caos. O homem acentuou o poder da máquina para fugir da parte que odiava em si mesmo, o caos, a natureza, mas a máquina por desejo, já que era fruto do homem, então algo desejante, mostra ao homem que ele vai ser destruído pela destruição que sempre gerou. O corpo é sujo para todos, odeiam seu corpo e o corpo dos outros, odeiam o que chamam de organismo. O corpo queer odeia o organismo e não ama seu corpo, mas o deseja como ele é: sujo e impuro. Os palavrões são palavras de ordem, que mostram o ódio ao corpo: que merda. Cuzão. Vai se foder. Te fode. Bundão. Boceta. Caralho. Mijão. Vai tomar no cú. Porra. Merda. Boceta cabeluda. Escroto. Chupa aqui. Punheteiro. Tudo isso mostra como o corpo, o sexo são base de fantasmas, de ódio, de repulsa. Um cú é objeto de ódio. A mulher não consegue transar, se sente mal, nem se masturba; as menininhas se sentem putas por beijar mais de um cara. Fazem a festa e depois a ressaca. A esposa que é puta na cama, mas no espaço público é a santa. Os fanáticos religiosos que trepam, fazem 69, mas se dizem puros. Se soubéssemos o que nossas mães fazem na cama nunca as beijaríamos no rosto. E fazem tudo isso e nem notam, não notam a si mesmos, já que acham que não sabem o que fazem, não pensam no que fazem, não tem controle do que fazem. Sublimam seres puros como crianças, vovozinhas, unicórnios, amam a pureza de filmes puros, mas fazem sujeiras na cama e demonizam os seus por fazerem sujeiras na cama; eles não se notam. “Minha mãe é uma santa, um anjo”, diz um personagem de Sin City; mas a mãe dele era uma prostituta na vida real; e qual o problema em ser uma? Elas são dignas, indignos são os que vendem o corpo por segurança, para manter as coisas como são. Espectralia. É a cidade dos espectros que co existe com a urbe. Não é a rede digital, não é o campo, a natureza, nem a metrópole, muito menos a necrópole. A espectralia é a cidade dos afetos, dos delírios, do desejo, dos sonhos. É o subterrâneo, talvez Hades, talvez o que chamam de inferno, ou mesmo de céu, é um ambiente em que a morte está presente, considerando “vida” um outro tipo de morte, a vida de zumbis, que negam quem são. A espectralia não tem prefeitos, nem gestores, nem cidadãos. O “cidadão” da revolução francesa apenas a contemplou após conhecer a máquina do senhor Guilhotin. A espectralia não tem trajetos determinados, já que, como disse, não é dominada por comando superior. Ela reúne inúmeros corpos sem órgãos, não todos, mas os possíveis na cidade. Há espaços na cidade que são portais prontos para levar qualquer um para ela. Uma cama, uma praça, uma mesa de bar, melhor um banheiro de bar, um buraco na rua, uma tenda na rua, o carrinho de um morador de rua, são portais para espectralia. Todos sonham, não podem fugir dos sonhos, e os sonhos são parte da espectralia. Às vezes isso fica óbvio quando sonhamos com a cidade. Pensar nos sonhos como uma mancha negra a ser limpa para entender a si mesmo, se encontrar, ou seja, interpretar os sonhos, é negar a potência deles. A interpretação leva a outras interpretações, e, no fim da vida, o idiota não quer morrer já que nunca vai ter alta do divã. Ele precisa continuar interpretando, esse é seu vicio; mas os sonhos como superfície, perceber suas imagens, sons, afetos, como eles são diferentes dos normatizados, entender que é uma realidade em si mesma, é aceitar, amar sua potência. Para o homem dominante, o morador das cidades, os sonhos habitam espectralia. Para um monge em retiro, para o eremita do campo, povos aborígenes não civilizados, para eles os sonhos provavelmente levam a outras ambiências e não para espectralia. Certas tribos indígenas narram os sonhos para os seus, já que não os consideram como algo pertencente a um sujeito e seu buraco negro. Espectralia não é a cidade perdida, não é origem nem destino, é devir. A cidade, a cidade como modelo, é a cidade dos mortos, dos zumbis, é a necrópole. A cidade dos espíritos é mais próxima da vida do que a necrópole. Não há vida na necrópole, e quando há vida nela, essa vida diz respeito à espectralia. Espectralia não é a utopia, o bom futuro, é a vida atual que agencia tanto a potência da vida quanto o esgotamento dela, a morte. Suicidas, seres violentos, serial killas, loucos, também habitam espectralia, como os amantes da vida, os dãndis, os apaixonados, os iluminados, os artistas, e eles, os amantes da vida, podem ser também amantes da morte, da violência, do suicídio. A cartografia mostra a impureza da vida, a necrópole e a espectralia em conflito. A música, a arte sem materialidade, vive em espectralia. Alguns filmes habitam espectralia; algumas pessoas só conhecem espectralia já que nunca viveram a vida de todos na urbe; outras são apaixonadas por seu ambiente, então chamam Dionísio, os xamãs, os curandeiros negros para que eles as levem até ela. O barqueiro do Estige é um curandeiro, um xamã, mas quem atravessa o rio tem que pagar um preço. Poucos entendem o número vinte sete: dois sete é quase três sete, e três sete é vinte um. Jim Morrison, Jimi Hendrix, Janis Joplin (um triplo J, o J tem o som de I em muitas línguas, e I é a nona letra, 9 é 2 sete) morreram com dois sete, e depois do dois sete veio o três sete: a morte. O 21 é o fim do jogo, a cartada final. Sim, a morte é o ambiente no qual espectralia é mais uma das suas linhas; e estar em espectralia é estar morto, mas vivo, ser um undead, um vampiro, como cantava o Bauhaus. Os góticos amam espectralia, encontram nela Thanatos, o spleen; os hippies foram os primeiro em massa a conhecer a fundo espectralia; já os punks atuam nela com um afeto não místico, eles são materialistas ao extremo, mas sim violento; todos eles, a partir de seus afetos, o amor, o desejo da morte, o ódio, foram forjados em espectralia. Sim, forjados como arma, já que eles são armas contra o bom senso. O punk, o hippie e o gótico, quando surgiram, caminhavam pela necrópole, mas estavam em espectralia. Eles permitiam para os bons cidadãos ver algo possível apenas pelo terceiro olho, já que eram monstros, fantasmas na rua, e por isso também portais para a cidade dos fantasmas. O bom cidadão tinha medo não do que via diretamente, um monstro, mas exatamente medo de ter esse contato direto com a outra cidade. Se drogar, fazer uma bela festa e depois sentir a ressaca é estar em contato com a morte por se estar dentro de espectralia. Morrer não significa se mudar para espectralia, mas sim apenas morrer, e ninguém sabe ao certo o que é a morte, mas muitos sabem muito bem o que é espectralia, que é um ambiente também da morte. Os garotos tomam ácido em plena rua e logo após estão em espectralia; continuam tomando e tomando, muitos viram cães de rua, outros viram cães famosos, como Júpiter Maçã, Arnaldo e Sid Barret. Kurt Cobain, que morreu com 27... sua representação em Last Days o mostra como alguém em outro mundo; no filme, em determinado momento, ele está de pé, parado, e vai caindo lentamente, essa cena dura e dura radicalmente. Jimmy Page, na sua fase mais pesada, às vezes demorava uma hora para ir da cama até a porta do quarto de hotel. Os olhos vermelhos de Pink em The Wall é a representação mais real de alguém completamente chapado, nunca foi visto olhos tão vermelhos na história da cultura pop. Pink estava em espectralia, como o Kurt de Last Days e Jimmy Page. Ozyy Osbourne simplesmente desapareceu em uma turnê, todos pensavam que ele estava morto, mas estava desmaiado no quarto de hotel, adormecido em espectralia. Os viciados em heroína adormecem em qualquer canto: Stiv Bators apaga em cima do prato de sopa; Iggy Pop, ao lado de Bebe Buel, pela cidade, letárgico; Jim Carroll sonhando em plena sala de aula. A heroína, a narcose dela é espectralia, mas não só ela, o álcool também: viva o coma alcoólico! No início dos 90, em Porto Alegre, de manhã cedo, no fim de semana podiam ser contemplados jovens e mais jovens dormindo na frente dos bares do Bom Fim. Casper, o fantasma camarada, personagem de Kids, bebe, usa drogas, transa com uma amiga adormecida e acorda nu depois sem saber o que tinha acontecido. Burroughs, como personagem em Naked Lunch filme de Cronemberg, nunca se recorda no que aconteceu no dia anterior. Burroughs, na vida real, encontrava seus textos e não sabia se ele quem realmente tinha escrito, possivelmente talvez tenha sido algum fantasma de espectralia. A narcolepsia do personagem principal de Private Idaho... ele simplesmente apaga e dorme em qualquer lugar na cidade, melhor, de espectralia. Sonho é irmão da morte, sonho e morte são duas temporalidades sempre conectadas. A heroína é a droga preferida pelos punks realmente punks, e talvez sua narcose revele de forma mais clara espectralia. Demora pelo menos duas semanas de uso contínuo para ficar viciado, e depois de ficar viciado, nunca mais se deixa de ser um. Duas semanas de uso, de contato extremo com espectralia, faz com que se fique preso nela, até a morte. O som punk, violento e sujo, parece mostrar melhor a vibe, o vício em heroína; heroína é chamada de lixo, e o punk é um lixo; mas é estranho uma banda tão para cima como o Happy Mondays ter um vocalista viciado em heroína. O hospício e a prisão estão na cidade e são portais para espectralia. A cidade da peste de Herzog, a cidade da peste de Da Vinci, a cidade da peste dos crakeiros, não são espectralia, mas também são. A cidade limpa, dos corpos limpos, das pessoas de bom gosto é a negação da cidade dos espectros. Mas sim, o hipster também enlouquece, toma suas drogas que não são apenas maconhas gourmets, ele sonha, delira, ele faz isso pra fugir da cidade dominante. Estar em espectralia é sair da mediatização da vida, é viver a vida. Muitos conhecem a vida apenas de forma midiatizada; para eles a vida é espetáculo. Viajam para conhecer espetáculos que já conhecem, o modelo de cidade. Os smart phones talvez tenham trazido a massa para as ruas, o que não era permitido pela televisão e o PC, porém a massa nas ruas, não as contempla, mas sim seus smart phones. Muitos cientistas negam ver as ruas, viver elas, então escolhem como objetos o que está atualizado em livros, documentos, mídias, etc; mesmo certos etnógrafos urbanos criam um bloqueio entre vida e pesquisa, eles estão nas ruas, mas não como pessoas comuns e sim como pesquisadores. Passaram a vida toda pensando que sexo são tarinhas de almanaque, que política é voto, que arte é qualquer coisa em um museu. A bunda queima, deve queimar, é algo simples, mas para muitos a bunda queima já que leram nos almanaques sobre os métodos para apimentar a relação. Em espectralia não há vagina nem pênis, apenas múltiplos cús, o Deus Cú, que é o comum sexual de todos. O machista pensava que não tinha um cú, as mulheres e as crianças riam dele, ele era a única pessoa do mundo que só via o cú dos outros. As mulheres e as crianças quando falam não rosnam, nem enchem o saco, elas podem falar e muito bem de espectralia, mesmo que muitas vezes rosnem e encham o saco. Elas se forjaram ali, sempre falaram da bela cidade, mas o macho sem cú não ouve, nem sabe que sua merda faz barulho quando chega em qualquer lugar. Ele só sabe fazer merda, mas é tão cego, tão insensível que não percebe. O padre mentiu também que não tinha cú e um cú satânico. Mentiu, mas todos sabiam que se tornou padre pra comer e dar o cú, sua vida de vergonha. O assassinato é a imposição, o poder que se quer como poder mata quem não quer morrer. Na espectralia o assassinato é consenso entre os pares, nunca uma forma de vendetta. V de Vingança é a espetacularização dos anonymous, dos espectros. O noise, a visão borrada, o gemido, o tiro sem dono e alvo, a drag queen, o queer, o anormal, os anômalos, o punk, o trovão causado por um bocejo, o bater de asas da borboleta que causa a excitação da massa, tudo isso concerne à espectralia, a cria. Talvez espectralia seja a real cidade que vivemos, nunca saímos dela, sempre estivemos nela mesmo quando não existiam cidades. Alguns têm que correr atrás da cidade dos espectros já que só vêem o coelho negro correndo, outros ficam parados, estáticos, mas explodindo de vida já que entram na cidade fantasma a partir do tédio e do bocejo. Românticos. Classe de demônios, filhos de Dionísio. Os românticos são os marginais que tem como foco de produção a arte. Eles não separam vida de obra, e assim criam obras que chocam com a moral dominante. Podem ser considerados Diablos, porém são mais especificamente um tipo de Diablo. Muitos deles atuam em um campo com visibilidade exatamente para atrair, capturar subjetividades, ou aquilo que chamam de alma. O romântico pode ser pensado não apenas como sujeito, amoral e não sujeitado, mas como devir; então romântico se refere a existências diferenciais que habitam espectralia. Há algo de romântico em todos, e romântico não é romance, mas também é. Os anarquistas pós-modernos. São demônios radicalmente materialistas, são atualizações do demônio Legião. Ganharam visibilidade no pós moderno por suas atuações em rede. Sua ação tática nasce com os românticos modernos. Eles atuam na cidade, são meio punks, meio hippies, meio guerrilheiros urbanos. Sua produção desterritorializa a cidade, ou seja, produzem focos de espectralia, vistos nas ações dos blac blocs, nas ações lúdicas, nas okupas, nas manifestações. É um agente político, não romântico, mas há algo de romântico no anarquista.  O policial corrupto. Ele é um dos instrumentos do grande irmão, porém possui algo de diabólico, já que age na borda entre legalidade e ilegalidade. O guerrilheiro urbano fazia o mesmo, atuava legalmente nos movimentos estudantis, trabalhava, mas tinha uma outra vida, lutando contra a ditadura. A questão é que o policial tem elementos satânicos, mas do satanismo criado pela moral cristã: é mau, odiento, odeia os fracos, os preceitos da teologia da libertação, quer poder, dinheiro. O guerrilheiro é satânico já que busca a destruição de símbolos dominantes. Queer. É filho de Baphomet como apresentado por Eliphas Levy. É um dos monstros mais potentes do pós moderno e pode ser confundido com o anarquista. O improdutivo. Seu desejo radical é zerar a sua existência. Diferente do niilista satânico cristão que deseja a destruição total. O punk purista é um dos improdutivos. Os cínicos, os hippies. Classes de demônios que buscaram viver com o mínimo possível. Aprenderam com Cristo, porém não são humildes, são orgulhosos de sua potência.  Grande irmão. Ele é o que resta da deidade cristã. Milênios da cultura cristã fizeram com que todos se submetessem a um olho que tudo vê. Por isso as mídias foram facilmente assimiláveis. Hoje todos estão visíveis o tempo todo, todos se olham, a si mesmo e aos outros, naturalmente. O romântico é visto pelos olhos e sua potência é impedida. O grande irmão impede a conspiração. O grande irmão sustenta o modelo de cidade, o endurecimento da cidade, o estriamento da cidade. Sociedade de parceiros. As lutas de subjetividades que atuam em espectralia, como os anarquistas, os queers (considerando queer como a subjetividade sexual que reúne todas as minorias sujeitadas ao patriarcado), os guerrilheiros, que são precursores dos anarquistas pós modernos, os românticos atualizados nas subculturas, na arte (motor de lutas de minorias, que permite aos jovens um papel privilegiado, já que mostra seus desejos), essas lutas, na vitória parcial e no pacto com o poder, pacto silencioso, criaram uma inclusão generalizada da diferença, uma horizontalização entre minorias e focos do poder. O pai, o patrão, o professor, o marido, viraram parceiros dos sujeitos submetidos a eles, e isso é o que chamo de sociedade de amigos. Esta é a relação dúbia, de choque e aceitação, entre o terceiro olho e os olhos do grande irmão. O símbolo maior da inclusão da diferença na cidade do espetáculo, na necrópole é o hipster. Ele é andrógeno, é qualquer um, é todos; ninguém sabe se ele é gay ou hétero, se é rico ou pobre, se é alternativo ou moda, ele é politizado, mas faz parte de uma esquerda que é simulacro, ele é ecologista, mas de boutique, ele tem traços de anti capitalista, mas é capitalista, ele usa drogas, está nos portais que leva a espectralia, mas a cidade moldada para o hipster é a necrópole, é o bom cidadão que vai as ruas, está nas mídias sociais falando de cultura e política. A denominação hipster já é uma apropriação, uma captura pelo grande irmão. O hipster nos Estados Unidos nos anos 40 era o cara das grandes cidades que andava entre a marginalia; era um branco negro, White Negro, um sujeito dúbio, intelectual entre a marginalia, era um anômalo, um conspirador. Hippies, os filhos dos hipsters, eram os jovens que queriam largar tudo, viver outra vida, que chocavam com suas roupas multi coloridas, seus pés descalços e cabelos compridos. Eram monstros, talvez os primeiros da era dos monstros, o pós moderno. Neal Cassady era o Pantagruel do sexo, tinha um apetite sexual monstruoso. Burroughs era um Pantagruel das drogas, Bukowski do álcool. “Os caminhos do excesso levam ao palácio da sabedoria”, e a sabedoria é loucura, e a loucura é o terceiro olho, por isso Blake também dizia que “as portas da percepção devem ser abertas”. Após a contra cultura os símbolos sonoros e visuais dos produtos culturais devem e muito aos símbolos da psicodelia – o efeito da droga marca dos hippies, o ácido. Mario Bross, um jogo para crianças, mostra um Mario completamente louco, com olhos que brilham pelo ácido e alguma droga estimulante, correndo pela cidade. Em momentos, ele sai da cidade, da necrópole e entra em outros mundos, esses outros mundos são parte da espectralia. Os Smurfs são bichinhos azuis que vivem em cogumelos na floresta. Cogumelos são uma fonte de psicodelia, e quando se toma ácido são vistos bichinhos. Os Smurfs são uma viagem psicodélica, de alguém que entrou em espectralia. Gargamel, aquele que quer acabar com os bichinhos, os Smurfs, mostra que a viagem pode não ser prazerosa, pode ser uma bad trip. A cidade mágica de Harry Potter coexiste com a necrópole. Alice é precursora de Harry Potter. Matrix mostra dois mundos, e Neo só entra no outro mundo quando persegue o Coelho Branco. O Show de Truman faz algo diferente, mostra uma mini necrópole, mostra a necrópole para os que vivem nela, e eles, os habitantes da necrópole, se regozijam com ela, com a morte. As bandas de Black Metal fantasiam mundos diferentes em shows e clipes, mundos habitados por seres de negro, semi mortos, demônios, mundos em que os símbolos do cristianismo são destroçados. Louvam a morte, desejam a destruição, e eles não negam isso, reconhecem a morte e querem ela; são amantes conscientes da necrópole, já que os inconscientes dizem que a necrópole é o espaço da vida, dizem que ela é “meu espaço de espetáculo pessoal, o local em que tenho 15 minutos de fama já que sou hipster, um sujeito espetacularizado”. Os olhos do grande irmão na mídia. O sujeito midiatizado vive uma vida privada possivelmente não mediada e uma vida pública midiatizada. As mídias não se reduzem aos media das grandes corporações: há mídias de resistência, que mostram algo concernente ao terceiro, e há as outras que são parte dos olhos do Grande Irmão. Os sujeitos dominados, os que moram na necrópole, os zumbis, insistem em apenas ver o que o Grande Irmão permite. Os media falam e falam, e eles ouvem. Essa é a sua necessidade de segurança, aceitar o mundo como dizem que é. A negação do mundo, que não é reativa, mas afirmação da vida, é feita pelos românticos. Todos dizem que a mídia mente, desde sempre se falou na alienação da TV, a esquerda sempre afirmou isso, mas os sujeitos não conseguem não consumir as mídias, e, por isso, aceitam o que ela diz, esse é o mundo para eles. O mesmo com a área da saúde que constantemente se desmente. A área da saúde como espetáculo faz isso o tempo todo, já que desmentir suas mentiras, dizer que suas verdades não são mais verdades, vende, ou seja, é espetáculo. Mesmo assim, com as contradições da área, suas variabilidades, suas deficiências, todos seguem o que é dito por elas, sabem que são ilusões, mas por segurança se apegam às ilusões. Precisam de segurança, então aceitam. A esquerda é um simulacro, é algo que existiu faz muito tempo e que não mais existe. Como a política dominante é centrada no dualismo, todos aceitam o que é vendido como esquerda. Viver para o cidadão da necrópole é aceitar, se submeter, ou seja, como disse, viver para eles é estar morto, sem vida, ser um Zumbi. Traumas, auto punição. Os sonhos e delírios de espectralia não dizem respeito a um indivíduo, não são os traumas do buraco negro do neurótico, psicanalizado. Os traumas não habitam espectralia, habitam os sujeitos que vivem a necrópole. Ser perseguido pelos traumas, se auto punir, buscar salvação são formas de morrer, de negar a vida; estão sempre no passado, choram, se deprimem, ficam neuróticos, e violentos, amam suas dores, seus sofrimentos, são auto indulgentes. 

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