quinta-feira, 13 de outubro de 2016

umas crônicas foda de controle

Adolescentes riquinhos  

Uns caras da classe média, filhinhos da mamãe, que vão ser os pais da classe média do futuro. Mas eles não são a versão mais jovem de papi e mami. Eles tão na rua de madrugada num bus passando uma vila, cheio de maloqueiro no bus. Eles tão bebendo vodka de garrafa de plástico e tão fazendo amizade com os blacks. Eles tão de manhã cedo acordando no meio da rua com um monte de gente ao redor na mesma. Vômito no chão e tudo mais. Eles tão subindo o morro de madrugada e são amigos dos trafi. Eles frequentam a casa dum traficante, um cara fodido, com aids, a mulher também, e os filhos do trafi tudo magros e fodidos. Se bate fome e tão sem grana comem até do lixo. Eles transam no mato. Eles fodem em banheiros sujos. Mas meu, eles não tão imitando o bebê que faz caquinha nas calças ou vomita a papinha no peito, meu... eles tão fugindo exatamente disso, ou de repente, tão tornando a impotência da criança na potência. Claro que eles sempre voltam pra casa, para a caminha com edredom. Podem pegar o carro de papai quando fazem 18. Vão pra praia nas férias. Vão pra Disney. Mas entre 13 e 17 anos meu, na noite são como mendigos. Mesadinha acaba na hora com umas pedras de fumo, e o resto do mês...  fazer o quê?  Os garotos sempre pensam, de repente fazer um michê pra conseguir grana. Se for com uma mulher nem precisa pensar. Fazem uns lances de pobre, drogado, veado, puto, maloqueiro, e tudo mais. Experimentação, de tudo que papai e mamãe odeiam. E daí classificam e dizem: isso passa. E é pra passar, não pode continuar, e os jovens vão envelhecendo: aparece carro, viagem,  trabalho, dinheiro.  O cara comia comida do lixo, em meia hora chega o sushi. Ontem tava bebendo vinho de três real, hoje é whisky escocês e red bull. A cola de sapateiro virou 50 gramas de coca, comprada por um amigo já que não sobe mais o morro e nem mais trafica. Transa de pé, mas no banheiro com água quente do  ap, não no banheiro de um bar com um mina pra lá de louca. Catava bituca no chão, juntava e com uma seda fazia um crivo; hoje tá lá o estoque de crivo pro mês todo guardado. A gente pode e é foda, a pobreza que se foda. Não quero nem me lembrar, diz mamãe quando pensa no filho que fumava crack. E o filho diz o mesmo. E mamãe fica braba porque filhinho tá corneando a nora, e lembra ele: você era um viciado. E ele se sente mal. Ela transava com todos os caras e depois chorava de culpa. Tava aprendendo a crescer.  E daí o esposo joga com ela: você era uma puta. E come ela por trás com dor. A mina filhinha da mamãe, o bibelô da casa: transou com o namorado viciado em todos os lugares, o cara comia ela em qualquer lugar, banheiros públicos, praças e ela gostava. A mina era quente demais na cama. Mas sem sujeiras. Era uma puta mulher. Era assim quando tava com o namorado doidão. Mas em casa vestia pijaminha rosa. Comprava artesanatos, brinquedinhos.  Mamãe dava suquinho de maça antes de dormir. A princesinha da casa. Hoje ela tá velha, nem se lembra da juventude. Nem se lembra, mas a juventude tá presente, toda a noite quando toma remédio pra dormir. E ela fecha os olhos e tem pesadelos. Oh, o que foi que eu fiz, eu era uma vadia. Vadia a mãe que fechava a mina em casa; batia nela quando ficava um mês fora de casa na rua sendo um outro tipo de vadia. A das nossas, mano. Daquelas minas do rock que a gente admira. Mina que só os manés falam mal. E ela fecha os olhos quando o marido a come, e experimenta algo relacionado ao passado, mas depois se olha no espelho e diz com culpa: eu sou uma vadia. Deixam de lado a experimentação, põem no lixo. Isso já passou. Era adolescência. Hoje você é homem e tem que impedir a experimentação, principalmente pro seu filho. Odeie a pobreza, a vagabundagem, e tudo mais. Você parece um negro, tá agindo feito bicha. Acabe com o minoritário em você. Não experimente. E a questão não é de fuga momentânea da caretice, mas uma questão existencial. Ele velho, com seus quarenta anos, um tio bem-sucedido, pai de família; ele experimenta um lance meio homossexual quando caminha, e gosta disso; não é muito, mas é um pouco; depois o filho vai dizer “eu sou bicha” e ele vai dizer: curta a vida meu filho. As minorias vão pra rua, dizendo: não nos incomodem; e ele vai dizer: meu coração está com vocês. Não sou pai de vocês, sou uma bichona, mesmo sem dar o cu. A mulher vai chorar enquanto ele a penetra, e ele vai dizer: não chore, você não precisa ter vergonha de ser mulher, quando eu penetro a sua, na verdade é você que está me penetrando; aí o território dos dois aumenta, podem mais. Eu sou sua mulher, enquanto eu penetro a sua, seja meu homem, não aquele que tem poder sobre mim, mas aquele que está do meu lado. Seja puta com alegria. Somos todos veados. Somos brasileiros e favelados. Viva a pobreza. A gente se fode, mas é divertido. Uma grande putaria. Carnaval. Isso que se impede, a alegria contra uma suposta seriedade. Sou um homem sério, sou uma mulher séria. Mas aqui ninguém tá brincando, não é qualquer coisa, já havia dito: experimentação do texto acadêmico. Torcer o pensamento, cavar até lá embaixo, no lugar que tá o demo. Traçar caminhos. Uma hora a gente acerta. Me erra!  

Texto indignado contra os caras do consenso 

Eu tô falando exatamente com você e você sabe muito bem disso. E quando você lê isso, dói as suas... costas, já que eu meto bem onde você quer levar, essa é a real. E eu gosto disso, sou às vezes como você, um filho da puta... mas o lance é você, quem está em jogo... você foi filho da puta por muito tempo. Você deve. Você sustenta essa merda e diz que não. Você diz que é cool, que luta contra a merda. Só que na real, isso é a sua forma de manter as coisas como elas estão. Só que a gente tá de olho em você e você sabe disso. Sua política mantém essa merda mesmo que você diga que lute contra ela. Sua saída é se tornar puta ou puta. A puta que nos fode ou a puta que é puta como a gente. Nós, as putas com alegria.  E você sabe o que isso significa quando você é inteligente, quando é dos nossos. E aí, mané, vai encarar? Já sabe com que tá lidando. SOMOS LEGIÃO. E a gente vai lutar até acabar com você; a gente quer derrubar tudo que você construiu. E você está em tudo, ou tudo está em você. E como é que é? Você acha que eu vou deixar tudo de lado e que vou escrever uma tese exatamente sobre você, toda branca e limpinha, cheia de palavras retinhas, tudo muito veado? Acha que vou dar a real sobre você sem ao menos dizer: eu vou pegar você e vou quebrar você e acabar com você? Acha que vou quebrar sua cara apenas com um texto insípido, como se fosse uma carta branca de paz? Cuspir na sua cara é pouco, e uma tese não faria mais que isso. E todos sabem que você é o problema, que você reforça o problema. E arma branca é pouco. Um tiro é pouco. Eu quero acabar com você e isso vai doer e muito, da forma que você tem mais medo. Vamos acabar com seu mundo. E não com palavras apenas. Eu não deixo minha paixão de lado. Eu quero vida e sangue. Se eu gosto do gozo quando eu trepo, eu quero trepar loucamente e estou fazendo isso agora, trepando com sua vida, fodendo com sua vida. Não basta falar sobre a loucura, estou fazendo a loucura, experimentando... com você agora. Você está faz tempo sentando e calmo na sua vidinha, e a calmaria acabou: CHEGOU A HORA. “Controle-se”, você diz o tempo todo, e isso está dentro de nós, mas agora...  é o reverso. Vamos acabar com o controle, vamos enlouquecer; aprendemos isso na juventude e agora é guerra. “Controle o que você fala e o que você faz. Sente-se como se fosse um âncora de TV. Não fale merda. Escreva de forma insípida. Faça o certo. Enlouqueça longe. Faça o que você quiser longe; não chegue bêbado, ou se chegar: imite alguém sóbrio. Faça as coisas certas. Ou finja que está fazendo arte.” Que você é um cara legal, que curte arte, já que arte é coisa de gente legal, livre. Você entende o significado de indignado. Não é?

Escrita maluquete

Só que mano, tô meio maluquete. Acordei assim semana passada, e depois não dormi mais. Tô meio maluquete, cabeça queimando. Parece que os neurônios tão se indo. Parece não, os neurônios tão na neura. E putz, véio, num tomei nada. Tipo Roger Waters 20 anos depois da fase do doce: “um flash back me pegou, pensei que ia ficar que nem o Syd”. Tô mais pra Waters, mas estar em Waters é ter medo do Syd, nosso Syd. Syd em mim. Mora um Syd no coração de todo cidadão. Véio, figura, mano. Loucura veio pra ficar, e se ficar meu... Já tô numas, eu pirado, saindo pra rua e mandando: mano, trafi, tem uma noia pra me passar? Trafi, tem um deliriozinho só pra mim, do bom pra vender? Mano, trafi, tô a fim de qualquer coisa, pode ser uns tocs, ou até um déficit de atenção. Pode ser até deprê da boa. Me vende aí uma bipolaridade.  Porque se passo o meu lance pros cara da saúde, os cara me trancam, daí vou pro xilindró. E daí o lance é fugir, meu. Sair correndo. E não só noia, meu, qualquer coisa viagem.  Me vende aí uma viragem de 180 graus do cabeção. Pode ser uma viadagem. Umas horas de lésbica. Me vende aí uma cor pretinha, pra eu ficar neguinho. Pode ser uma dose de cigano. Qualquer barato.  Me vende umas horas de sapo. Virar um sapinho e curtir um lance úmido. Meu, tem um lance pra vender tipo norteafricano na Europa? Tipo, cubano nos anos 80 na Flórida? Meu, preciso de qualquer coisa. Cansei de correr. Tô dando volta e tô tonto. O mundo tá muito circular, sei lá. Me passa aí um câncer, me passa um avc, qualquer barato meu. Pode ser um hiv. Pode ser uma dose de qualquer coisa de duas horas, meu. Qual é. Vai deixar o mano na seca? Só não me passa barato ruim: tipo ladrão na cadeia; tipo viciado em clínica; tipo doente em hospital; tipo louco no manicômio. Meu, não quero ar livre, me vende uma poluição. Meu, me trafica um ataque nuclear. Meu, me dá uma radiação, qualquer merda. Meu, me passa aí uma febre religiosa, tipo: amo deus. Meu, me passa um lance meio vadia, transando em banheiro em fim de festa. Me passa aí um barato tipo briga de faca na rua. Meu, me dá uma noite inteira por duas horas, cara. Pode ser também comida transgênica. Rango de super, sucrilhos, doritos. Uma ceva brasileira. Um vinho da colônia. Um mcdonalds. Meu, qualquer coisa. Pode ser até notícia ruim. Meu, me manda uma notícia horrível, tipo: depois de dez anos de revolução nada mudou. Meu, tá vendo que tô sendo flexível. Topo todas; qual é? E aí? Só não me coloca numa fila. E se for engarrafamento, só devido a acidente com mortes. Me dá uma morte aí, meu. Uma morte eterna, no fogo do inferno por duas horas, meu. Muito a fim. Mina feia. Puta com dst. Qualquer coisa. Me dá umas veias cheia de coágulo, abscesso. Conhaque francês falsificado do Paraguai. Me dá uma traição. Me dá uma chifrada da boa. Mas tem que ser junto ao mar. Meu, me dá uma frase: seu cachorro. Pode ser criança chorando; o choro de um monte de crianças. Depois eu pago. Passa agora. Senão, vou cair numas. E pra prisão não volto.

Relacionamentos

Viver uma vida clichê não é difícil. Melhor, difícil é não viver uma vida clichê. Imite um filho, imite um pai, imite alguém incluído; ou mesmo: imite uma bicha. Tudo muito fácil. A gente sabe como agir, tá tudo pronto. Imite um namorado. É só comprar um fone de ouvido, a mina vai falar a tarde toda. Mais sutil: finja que você está interessado. Se o cara não finge, se está interessado, é porque tá fodido... encontrou o amor de sua vida. Vive num conto de fadas, naqueles que se diz de coração: você chupa bem, meu bem. Mesmo que ela não saiba o que tá fazendo. Difícil fingir ter paciência. Impossível. E tem uns caras que querem isso pra sempre. O cara do filme o Homem do Ano (do José Fonseca), diz: quero casar, ter filho, arrumar um emprego. No fim, mata a esposa, vende o filho, larga tudo, cai na estrada. Deve ter prestado atenção no Pereio que diz no filme: são todas umas vingativas, umas chatas, tem que dar porrada. Sobre filhos, Pereio lança outra: no casamento o que é mais complexo são os tipos de merda, tem de todo tipo, nada muda de casamento pra casamento, só a merda. E eu falei acima do cara que tem tesão de gozar e falar: quero casar com você. Uma boa tática pra brochar, isso sim. Outra tática é olhar pra esposa ou namorada de longa data. Mesmo se for bonita, deixa de ser de tanto o cara olhar pra ela. Por isso, o cara tem que ficar na espreita, olhar as minas que tão namorando há mais tempo. Forma mais fácil de pegar mulher bonita. E já faz um bem pra sociedade. Faz elas se sentirem amadas por alguém.

Retorno

Reviver uma história, só se foi suave, sem compromissos. Sem que se saiba muito um do outro. Senão, quando a coisa esquenta, se acrescenta o passado, coisas do tipo; ele: você era uma puta que eu sei. Ela rebate: e você era um filho da puta, que comia todas putas sem preservativo.  Ele, terminando a conversa: Como você? Andar pra trás é um saco; legal ficar cego, sem direção num giro de 350 graus.  

Gatinha 1

Pô, gatinha. Hoje quando chamam você de gatinha, são esses merdinhas que tão a fim duma mina mais velha e gata. Só que pra eles, na real, gatinhas são aquelas que eu chamo de crianças. Você era mulher, 11, 12 anos atrás. Daí eu tinha medo. Só que agora você é a gatinha. Gatinha, sou eu que envelheço. Eu que fico velho, você sempre mais gatinha. E você fica puta quando eu chamo essas menininhas de gatinhas. Mas entre nós é diferente. Você é mais velha, sempre foi... só que quando você sorri; quando seus peitinhos empinam; quando você fala; e você dança quando fala; e quando você caminha e rebola as coxinhas e a bundinha. Mina, você é a gatinha, demais. É, você diz: mas você chama todas as vadias de gatinha, eu sou o que, então? Você é essas coxas delicadas, mas fortes em mim. Essa boca que sabe muito bem o que quer. Daí fico aqui esperando, envelhecendo em uma madeira meio nobre. Só que a gente quer. Você quer. Eu quero. E a gente se encontra. Então, antes que a gente morra. Antes que ele volte. Ou que ele apareça. Ou antes que  a dança vire um bocejo. Antes que a gente vire o que não deve. Seja minha gatinha. Vai deixar essas crianças terem o que é seu? Meu corpo. Deixa assim, mas não comigo. Comigo não vai ser assim. As suas pernas viraram história. As minhas são mais fortes. Isso é bom pra nós. Sem complicação. No gelo você sabe muito bem se virar. Dança bem com o seu terninho de couro. Sabe muito. Só que quando você sorri e geme, meu bem, a gente tá jogando o mesmo jogo. É só deixar de imitar aquele tipo de gatinha. Você sabe mais. Posso tratar você daquele jeito. Você deixa, mas se sente mal. Então, vamos fazer direito. Como deve ser feito. A gente não vai casar. Não vai ter filhos. Vai curtir. E só. Fecha as pernas, meu bem. Mas fecha com o meu dentro. Me machuca que eu machuco, e isso é bom. Como você sabe fazer. E eu faço em você.   

Festa no centro  

Pegava metrô direto pras cidades vizinhas de Porto Alegre. Ia pra Canoas, Esteio, São Leopoldo, Novo Hamburgo, quando tinha entre 13 e 20. Muitos amigos viviam nessas cidades.  Um dia tava no metro. Tava voltando dum campeonato de skate. Era quase meia noite. Aparece um mano. Conhecia meio mal o cara. Só que a gente começou a conversar. O cara disse que tinha brigado com a mina. O cara era mais velho. Tinha brigado com a mina e tinha recebido a grana do trampo. Aproveitei a situação: mano, baixa uma ceva. A gente foi num bar bem no centro. Uma ceva virou umas dez das grandes. O mano tava bebendo feito água. Eu seguindo a onda. Eu morava na zona Sul. Saía só nos picos rock de gente branca. Esse mano era negro. Daí ele disse: vamos num pico que tem som e umas gatinhas. Era também no centro, do lado do Mercado Público. O dia era um domingo. Eu disse, vamos, já que ele tava baixando a festa. O pico era só um salão com um bar. Nada demais. Só que o público era bem diferente do que eu tava acostumado. Metade brancos, metade negros. E a aparência física das minas era... elas eram todas meio gordas.  O som que tava tocando era música regional. O pessoal dançava abraçado. O mano tava doido. Começou a pegar as minas. O cara pegou umas cinco em pouco tempo, umas feiosas. Daí meio que entrei na onda. Tava dançando com uma mina muito feia. Conversando com ela. Daí ela disse que no bar as minas eram todas prostitutas. Só que tavam ali curtindo a noite. Eu pensei: putz... as putas mais caídas da cidade. Daí o mano meio que se grudou numa feinha e ela nos convidou pra ir pra outro pico. No centrão, o mano encarou uns caras. Pediu pó. Os caras venderam. A gente deu uns tecos na rua. Quando dei a aspirada no lance... porra meu, deu um baque. Eu puxei o pó e cuspi. O cara tinha vendido uma merda. Fiquei com medo. O mano nem aí, continuou cheirando. Daí a gente foi pros bares da parte alta do centro, do lado da Santa Casa, um hospital. O som no pico, mais eletrônico, só que brega. Tinha um grupo de minas. Umas bonitas. Cheguei nelas, eram tudo lésbicas. Daí o mano apagou. Dormiu no bar. Eu peguei uma grana no bolso dele pra pagar o bus. Caí fora. Nunca mais vi o cara.   





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