Este texto é um riso de Satã que detalha a
vida do Bruxo, um filho, irmão de Satã, melhor, o Bruxo é Satã. O texto pode
não parecer, mas é um exercício esquizo analítico, pelos seguintes motivos: a
percepção molecular move o texto, como também ela é apresentada; o Bruxo é uma
subjetividade não uma identidade, o Bruxo é um intermeio, meio homem, meio
demônio, está na terra, mas também no inferno, sua identidade sempre é desconhecida
e ele se esforça para criar estranhamento, ele é um ator, é Satã, é um gênio, é
um espião, é uma metáfora, é uma ilusão; o Bruxo é monstruoso, se deseja assim,
então o texto é uma ode à monstruosidade, a monstruosidade do vampiro, sua
hiperssexualização, fome voraz, é parecida à do Bruxo, já que ambos são a mesma
entidade; o Bruxo aparece, em muitos momentos, como criador de si mesmo, ele
tem o poder da dessubjetivação, de deixar de ser o que impuseram a ele; o
conceito de Corpo sem Órgãos, mesmo não referido, é central para pensar a vida
sexual e afetiva do Bruxo, o Sexo Bruxo é um meio, não busca um fim como
ejacular; o texto sempre tenta criar mapas com linhas de naturezas
diferenciadas, ou seja, conjuga termos estranhos entre si: “o Bruxo lidera a Bruxa
que o lidera”, “Satã domina o Bruxo, que domina os românticos, mas os
românticos são Bruxos e, também, são Satã”, “a espada em seu peito criou seu
corpo, mas ele criou a espada, assim, ele se construiu”, “enganava tão bem que
enganava a si mesmo”, “era um assassino amoroso”, “o Bruxo não é tolo, ele não
acredita em bruxaria”, “ele vive em extremos, sempre, é um perverso, mas
amoroso, um viciado saudável, um louco que reconhece a loucura e, assim, a
domina”; o texto todo é uma ficção, mas parece ser um relato que não é fictício,
apenas religioso; a mentira aparece como potência frente à verdade, filosófica,
cristã, científica; o esquizoanalista – que se chama na verdade Legião, mas é
um Bruxo – escreveu o texto como uma linha de fuga,
aumento de território, rizoma, busca de diferenciação, ou seja, o texto é uma
experimentação diferente do já produzido pelo Legião. Por fim, a cartografia é
a esquizoanálise, e Bruxaria, como tratada aqui, é um conceito que se mistura
ao de cartografia, Bruxaria é um tipo de cartografia.
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O Bruxo aqui não é um Bruxo, mas a
subjetividade, como disse acima, que atravessa a história, e busco no texto o
comum entre Bruxos. Porém, desconfio que os Bruxos presentes em períodos e
localidades diferenciadas são sempre a encarnações do mesmo Bruxo. O Texto é
uma fábula, uma mentira, uma ficção, uma piada, mas também é rigorosamente
talhado a partir de relatos sobre a figura do Bruxo, atualizados em inúmeros
textos de Alta Magia; estes, apresentados aqui em recuo e referenciados, os encontrei
no “Fórum BetaDemo” presente na camada mais profunda da Deep Web. Os relatos,
os textos são traduções de traduções e não há como confiar totalmente em sua
origem; como estavam desconstruídos e pareciam ter sido traduzidos por
ferramentas digitais, eu fiz uma tradução final em português. Decidi também
padronizar o estilo textual para facilitar na leitura do que segue. Escrevi o
texto me pensando como um Artaud personificando um Nietzsche; sim, o mais
humilde fazendo o papel do mais orgulhoso, ou seja, o Gênio Menor. Gênio Menor
é um conceito advindo dos perdigotos de Satã no momento em que ele ri. Gênio Menor:
não um menor que se pensa gênio, o pequeno egocêntrico, o pequeno Hitler, o
pequeno que tem um certo dom e se banha nele para conseguir ser grande; o Gênio
Menor é um gênio que não quer ser gênio, ele odeia o que chamam de genialidade,
nega a si como pessoa especial, ele quer ser qualquer um, ele é uma puta
mexicana barata, e sua genialidade está aí, no seu desejo de menoridade. Toda a
tradição romântica é feita de gênios menores; sim, vivem na sarjeta, pois ela é
o lugar deles. “Eu piso na rua, sempre, me sinto em casa, na sarjeta, os ratos
são meus amigos e as baratas me cuidam, meu nome é rua, rua qualquer, eu sou a
rua, o caos... Quer pisar na rua, quer pisar em mim, pisa em mim, tá afim?”. “Se
me derem uma garrafa de vinho chileno, já que sou chique e gosto de vinhos
chilenos, podem até cuspir em mim, sou um michê gourmet.... Cospe em mim! Tá
afim?”. “Se você disser que gosta da minha obra, se você me puxar o saco na
rua, eu quebro a sua cara”. Sim, personifiquei (rindo, da piada), para escrever
o texto, uma grande mente, que traz a verdade sobre o mais profundo da vida,
como seu eu fosse um oráculo, ou mesmo como se eu fosse o Bruxo contando sua
própria história. Sim, um Bruxo, alguém com poderes, alguém muito mais forte
que o mais forte dos mortais. Fiquei um dia inteiro me olhando no espelho e
berrando: eu sou o caos! Passei então a acreditar, me sentei no teclado e
escrevi a “importantíssima” obra que segue. Depois que finalizei, fiquei três
dias consecutivos rindo (da piada), rindo de mim mesmo, da obra, risada de Satã.
O texto como sempre é escrito por Legião (demônio que aparece na parábola do
Saraceno), e Legião é UM demônio, porém ele é uma legião de demônios, por isso,
o texto parece ter uma organicidade, mas pensar dessa forma é um engano, é não
ver a Legião. A aparência do texto, assim como a imagem do demônio, é apenas aparência,
e os olhos nunca poderão contemplar a verdadeira imagem de um demônio. Penso no
indivíduo, o Bruxo, e na sua vida privada em relação à vida de outros, já que a
maior parte dos textos que encontrei apresenta o Bruxo como alguém radicalmente
individualista, e a radicalidade individualista é marca do satanismo. O Bruxo se
centra na sua existência, não pensa no social, não se importa com o destino da
humanidade. Quando acreditam que o Bruxo é O Bruxo ele se torna realmente Bruxo,
e, a partir daí, tem total controle dos espaços e dos sujeitos que neles vivem;
é como o vampiro que precisa da permissão dos outros, formal, para que eles
passem a ser atormentados. Sim, o Bruxo necessita da moral dos outros, de seus
medos, de suas paranoias para ter forças.
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O Bruxo não age por ódio, não se vinga,
não tem ciúmes, nem inveja, ele é frio, e não é cruel, mas é cruel em sua
frieza. O Bruxo gosta de contemplar as paixões tristes e a impossibilidade de
controle das pessoas comuns. Muitas vezes, se coloca como um objeto a ser
agredido, para que fiquem devendo a ele eternamente, já que ele não se vinga, e
sim: elas se culpam, têm vergonha do que fazem, agem sem controle. O Bruxo age
por intuição e ele sempre ganha, nunca perde. O Bruxo espirra e cai do céu uma
chuva de vinte uns. Perguntam sempre: “por qual motivo o Bruxo é chamado
de Bruxo, já que ele é mais forte que muitos demônios?”, e o Bruxo mesmo
responde: é minha piada, me chamo, me chamam como eu quiser. O Bruxo não é um Bruxo,
mas as pessoas acreditam que ele é, e ele, como é, às vezes, uma pessoa,
acredita também, não nas pessoas, mas em si mesmo. O Bruxo engana tão bem que
engana até a si mesmo. Quando o Bruxo chega na taverna, todos os que estão
presentes tremem, mas como não conhecem o Bruxo, pensam que é o frio; só que
foi o Bruxo quem trouxe o frio. O Bruxo a cada estação está em um vilarejo
novo, às vezes, sai do país, de trem, ou de barco, viaja sem rumo e acha seu
lugar, sempre. Ele faz isso para recolher dívidas em nome de Satã. O Bruxo joga
uma moeda para o ar, e é a moeda e o ar que escolhem seu novo destino. O Bruxo
é uma casca, sem nada dentro, uma bela casca que não esconde nada, sim, ele não
é nada por dentro. O Bruxo mostra que não tem vida a partir do seu olhar;
quando está em um duelo, ou numa batalha, quando está fazendo sexo, sempre, ele
apresenta um olhar de indiferença a si e aos outros. O Bruxo pode estar rindo
histericamente, pode estar declamando apaixonadamente, mas seu olhar demonstra
que não há a vida em seu corpo. Sim, o Bruxo é Satã, mas o Bruxo sabe que Satã
não existe. O Bruxo não acredita em bruxaria, ele é bobo, mas não tanto; o Bruxo
se alimenta da moral dominante. O Bruxo não usa métodos, mas pessoas que
acreditam nos métodos; manipula elas a partir dos métodos que elas conhecem,
ele não necessita de métodos: falar três vezes, duas vezes diz a verdade e três
vezes cria a verdade; sexo a luz de velas de sétimo dia para invocar sucubus e
incubus; pentagramas, sangue... O ritual não pode ser metódico e tem que se
despir dos símbolos dominantes, o ritual não pode ser uma cópia, já que a potência
está na criação e a cópia e só cópia. Como diz o Manifesto Bruxo na seção que
trata do Vampiro:
Buscam
a vida eterna e a figura do vampiro é desejada... O Bruxo Aerseth peregrinou
por estações sem rumo, era um Bruxo do movimento, amante do nomadismo. Decidiu
ficar um tempo em um vilarejo, sabia que deveria ficar ali. Alguns moradores do
vilarejo lhe apresentaram uma droga potente, que não conhecia, a droga era
extraída de uma planta local. Ele a usou continuamente, estava maravilhado com seu
efeito. Um dia entrou em uma igreja, exatamente, no momento de um ato fúnebre;
Aerseth ainda estava consumindo a poderosa droga. A embriaguez da droga
misturada com a pompa fúnebre lhe causou um estranhamento, e então sabia
exatamente o que deveria fazer: negar Deus completamente, negar em si o que
ainda restava (se é que restava) de crença na divindade cristã. Após isso ficou
dias vendo seres demoníacos; moradores do vilarejo que já conhecia pareciam
zumbis ou mortos vivos. Aerseth era novo, tinha vinte anos, saiu do vilarejo e
continuou sua peregrinação. Aos 45 anos ninguém acreditava que ele tinha essa
idade, parecia ter vinte anos, todos diziam; então, um dia, se olhou no espelho
e entendeu o que havia acontecido: o fato de ter negado Deus em um ato fúnebre,
fez com que ele negasse a parte fundamental do ciclo da vida, a morte. Ele não
mais iria morrer, nem mesmo envelhecer. Essa história passou por muitas gerações,
muitos tentaram repetir o ato de Aersteh como se fosse um método eficaz, porém,
nunca funcionou com outros.
O Bruxo sempre se afetou com a barbárie e odiou
a violência dos romanos e sua guerra racionalizada, a guerra por poder; ele
admirava os bárbaros, os que lutam por lutar, lutam não por ódio, mas por amor,
amor à guerra. O demônio Ferreiro e o Bruxo passaram algumas temporadas juntos,
ambos amavam o Aço, a primeira espada foi criada pela parceria entre eles. Os
nômades em movimento, amantes do movimento.... o Bruxo os movia. O Bruxo também
era o pônei ensanguentado, que alimentava os coletivos do Grande Kahn. A flecha
quando está no ar dança, e depois ela é cravada, se o movimento foi bem-sucedido,
em qualquer um. Alguém lança a flecha que atinge alguém... mas o Bruxo sempre
gostou de ver ela dançando no ar, com seu olhar molecular. O movimento da dança
das mulheres loucas na floresta é de natureza parecida com o da flecha; vaginas
queimando, ensanguentadas, desejando todo o poder dos elementais, que são
bruxos, amigos do Bruxo. As Naves dos Loucos levavam o germe da bruxaria para
inúmeros lugares; o Bruxo comandava o destino das Naves. Eurípedes era irmão do
Bruxo, e as Bacantes também eram suas irmãs. A Inquisição cristalizou a luta
contra a bruxaria. Giordano Bruno (tirando o N e colocando um X, o nome Bruno
vira Bruxo) era uma das múltiplas personalidades do Bruxo. A arte da memória de
Bruno era tão poderosa quanto a sua arte da respiração: sentir a respiração
presente em tudo na vida, nas nuvens, no solo, no subterrâneo, “devemos
aprender a respirar”, dizia o Bruxo Bruno. Belial e Dantalion queimaram o
coração do Bruxo antes dele se tornar Bruxo. Sem coração, apenas com o cérebro
pulsando, o Bruxo se tornou realmente Bruxo, mas ele sempre foi um, não “um” e
sim “O”. O Bruxo fala nas costas dos seres comuns, diz a eles que o futuro já
aconteceu, que apenas eles não reconhecem isso, já que são cegos. O olho
demoníaco já viu tudo, só fica esperando para que “o tudo” seja atualizado. Os
olhos divinos negam o olho demoníaco, que está na fronte. Satã está sempre nas
costas do Bruxo, mas o Bruxo está nas costas dos artistas, dos escritores
quando estes estão produzindo suas obras. Os fogos fátuos e os miasmas aparecem
quando o Bruxo quer. O Bruxo matou toda sua família, não queria que seres com
genética parecida vivessem, isso poderia abalar seu poder. O Bruxo não caminha,
ele dança no ar. O Bruxo olha sempre para todos os lados quando caminha; sua
genialidade, bruxaria, não o deixou paranoico, mas ele quer que todos pensem
que ele é um fraco, um paranoico. O Bruxo é um portal, Govinda Negro, ele atrai
pessoas, coletivos, demônios, animais; o Bruxo atrai até mesmo o sol, o arco
íris, a tempestade, o vento, a chuva. Se o Bruxo quiser, uma tempestade devasta
o vilarejo. Amy, conhecido nas “Escrituras Bélicas” como Assaz e no “Terceiro
livro de Danstorn” como Hanar, rege os estudiosos do tempo. O Bruxo é um
estudioso do tempo, tão profundo que consegue até mesmo controlá-lo. Como o Bruxo vive o tempo, seu poder
de ação não é localizado, um espirro seu pode matar uma criança dormindo em uma
parte distante do planeta. O Bruxo louva o caos, cria o caos, sim, ele é o caos,
ele gerou Nix e Érebo, que geraram a legião romântica, e o Bruxo, como disse, é
um romântico, aliás, todos os românticos são Bruxos e eles produzem o caos.
Satã criou o baralho, mas quem comanda o jogo é o Bruxo, ele dá as cartas, ele
joga, ele blefa e sempre ganha. O Bruxo jogava cartas com seres comuns e alguém
disse que o mundo iria acabar, todos queriam sair correndo, ver os familiares,
tomar o último porre, dar uma trepada, mas o Bruxo disse: vamos acabar o jogo! O
sujeito soberano, que pode tudo, é uma interpretação tola do satanismo. O “poder
tudo” deve significar não aceitar a moralidade cristã, que torna praticamente “tudo”
pecado. O Bruxo mata por amor, nunca por ódio, e obviamente matar por amor não
se refere à neurose da vida conjugal; “assassino amoroso”, a dubiedade, a
obscuridade, o impedimento da significação dominante. Quando alguém morre, já
que tentou ferir o Bruxo, não foi culpa do Bruxo; todos sabem que quando tentam
ferir o Bruxo se auto punirão. Os Gárgulas cuidam as catedrais, e foi o Bruxo
quem esculpiu o primeiro Gárgula. Samael é pai de Caim e Caim é pai do Bruxo. Kroni,
Hades, Lúcifer comandam o Inferno e convidam sempre o Bruxo para temporadas no
inferno. O Bruxo é um traficante, ele vende o fungo do centeio, a secreção do Sapo
Bufo, as fezes do rinoceronte, a carne negra da Centopeia Gigante, a Sagrada
Gandja, o veneno do Peixe Sapo, o Sopro da Flor do Dragão, o sangue da Serpente
Javanesa, o sumo do Cogumelo de Chiapas, o pólen da Flor AgriDoce. O texto
considerado primeiro sobre o Bruxo, presente na antologia NekroMantia, expõe o
momento em que o Bruxo descobre quem ele realmente sempre foi:
Ele
era fascinado pelos olhos, pelo olhar das mulheres, ele dominava a arte do
olhar, conseguia as capturar pelo olhar. Ele tinha facilidade em ler as linhas
das mãos das mulheres; ele lia as linhas mesmo sem as ver, lia apenas pelo
toque. Sim, ele dominava também a arte do toque. As mulheres não conseguiam ler
as linhas de suas mãos, e quando tentavam eram bloqueadas. Ele sempre conseguia
perceber as conjunções astrais, sabia a partir dos números o que estava regendo
certas estações. Para ele, tudo isso sempre foi natural. Apenas descobriu ser Bruxo
ao se ver no espelho... um dia percebeu uma mancha no peito com a forma perfeita
de espada. Em toda a sua vida fora um guerreiro, tinha cicatrizes em todo o
corpo, e quando viu a mancha, a espada, entendeu que havia sido a espada a
construtora do seu corpo e que ele havia criado a espada – ou seja, ele se
construiu.
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O Bruxo necessita da Bruxa para se
empoderar. A Bruxa não é sua versão feminina, é uma mulher com poderes, porém,
o Bruxo sempre domina as Bruxas. O Bruxo sabe muito bem os lugares em que deve
pisar, e raramente se engana se as pretendentes são Bruxas ou não; e sim,
muitas Bruxas só reconhecem que são Bruxas a partir do encontro com o
Bruxo. O Bruxo possui escravas, que são quase
Bruxas ou Bruxas de uma ordem inferior; elas variam de estação a estação, só
que há escravas que permanecem por muito mais tempo. O amor do Bruxo é
realmente expresso na relação com a Bruxa, mas as escravas também são paixões e
amores do Bruxo. O Bruxo e as escravas não têm necessariamente uma relação
direta – as escravas habitam muito mais o plano dos espíritos, e mesmo quando
uma escrava copula com o Bruxo, é uma cópula sem importância, ou seja, algo
inteiramente diferente do sexo entre o Bruxo e a Bruxa. Não há motivo para
dizer que o amor do Bruxo pela Bruxa é maior que o amor pelas escravas... são
amores, mas diferentes. As escravas fazem tudo por ele, o adoram, e têm um
certo grau de poder sobre ele – ele dá esse grau a elas para potencializar a
relação. Algumas escravas desconhecem que são escravas, pelo menos
conscientemente. As escravas são
escolhidas por afetos, elas surgem com o vento. A primeira parte do Contra
Evangelho, traz uma passagem que mostra o poder das escravas, mas também como
esse poder é perigoso para elas. O Bruxo é o termo dominante da relação,
exatamente, por não ter ódio e reconhecer a fraqueza das mulheres:
O
Bruxo Djim Morgattzen criou para si uma personalidade de Satã palhaço. A partir
dessa personalidade ele criou mais duas, a de gênio e a de idiota, e
radicalizou: um dia era Satã palhaço, no outro gênio e no outro idiota. Ele
radicalizou tanto que acabou entrando em uma área de descontrole, não tinha
mais controle das personalidades. Na mesma época, ele estava com sua Bruxa da
estação, e um dia, depois de exagerar com drogas, acabou a agredindo. As
escravas decidiram que o Bruxo iria pagar, seria jogado em uma vala de lobos
famintos. O Bruxo entendeu a situação, isso o fez voltar para sua margem de
controle, mas disse a elas: eu não vou me desculpar. Ele ficou meses ouvindo
das escravas que ele seria destroçado e não fez nada, apenas continuou com sua
vida. Como sua vida era encantadora para as escravas, o ódio delas foi se
dissipando. Ao mesmo tempo, um aspirante a bruxo, pretensioso, se aproximou de
Djim. O aspirante queria ser tão forte quanto ele e, por isso, o imitava; porém, errou totalmente ao repetir o o ato do Bruxo, agrediu uma escrava, e
as outras escravas o jogaram aos lobos; ou seja, ele pagou pelo erro do Bruxo,
e elas, também, tiveram que pagar pelo seu ato.
O Bruxo sempre é tentado pelas escravas,
pelas parceiras das escravas, por mulheres que querem ser escravas, ele as
atrai. Mas o Bruxo se contém, apenas dedica relação carnal às Bruxas. As Bruxas
lideram o Bruxo que as lidera. As escravas ajudam o Bruxo na escolha das Bruxas,
e as Bruxas sabem que podem contar com as escravas. A relação entre Bruxas e
escravas é bonita, é feminina, diferente da relação do Bruxo com todas elas. A Bruxa
nunca tem ciúmes das escravas, e quando as escravas têm ciúmes das Bruxas, sabem
que têm que se conter, pois esse sentimento pode destruí-las. O Bruxo escolhe
uma Bruxa por estação, não mais do que isso; se a relação é muito rápida, após seu
término, o Bruxo se obriga a ficar um bom tempo solitário; é central para ele, para
sua potência, a contenção sexual e afetiva. O Bruxo, às vezes, pode ser levado
pelos impulsos e copular com mulheres que não são Bruxas nem escravas, e isso o
enfraquece. Quando a Bruxa é escolhida, na hora o Bruxo diz a ela: eu sou teu
pai, você é minha. A Bruxa muitas vezes não entende, tenta se afastar, mas logo
depois de escolhida não há volta. O Bruxo dedica sua vida sexual a Bruxa; foca
na Bruxa o sexo para não se dispersar e, assim, se empoderar. O sexo com a Bruxa acontece apenas em certos dias
da semana; as relações mais importantes são aquelas contínuas, em dois dias
seguidos, principalmente de sexta até sábado, ou de sábado até domingo. O Sabath
é importantíssimo, marca o fim e o início da semana; aliás, o intermeio é
central na prática sexual, além do sábado, são importantes a meia noite e o nascer
do sol, mas nunca o pôr do sol, já que este é admirado por devotos de religiões
contrárias à do Bruxo. O Bruxo nunca ejacula no sexo com a Bruxa, o Bruxo
ejacula solitário uma vez por semana, no dia mais distante da última e da próxima
transa. Faz isso para que as transas com a Bruxa sejam terrivelmente intensas. O
Bruxo contém a ejaculação, já que ela é uma descarga violenta de potência
vital. Cada ejaculação precede algo de morte, enfraquece o corpo do Bruxo e seu
terceiro olho fica borrado, quase fechado. Quando se percebe que a ejaculação diz
respeito à morte, ela se torna algo não prazeroso. O homem comum transa para
ejacular, ou seja, busca um fim, o sexo para ele tem um início, meio e fim. Mas
transar sem desejar ejacular é criar um meio, que se estende, meio apenas, sem
fim; então, o meio se torna o mais importante, e nesse meio coisas impensáveis
para o homem comum acontecem. Se não há ejaculação, só meio, então não há
porque individualizar uma transa; o Bruxo e a Bruxa podem ir para cama em vários
momentos nos dois dias, e como não finalizam com a ejaculação, então, é sempre
a mesma transa. Se o Bruxo nunca ejacular (finalizar) durante uma estação com a
Bruxa, todas as transas foram uma transa; como mostra o livro A Bruxaria é um
tipo de Sexualidade, escrito por Saint Diavo:
Durante
a estação transaram apenas uma vez, mas essa transa durou toda a estação; às
vezes, eles paravam para descansar uma hora, às vezes duas, às vezes um dia, às
vezes uma semana; eles tinham que descansar para continuar transando mais e
mais e mais, e assim a transa durou meses. Eles não competiam entre si e muito
menos com os outros, os outros não importavam, o que importava era a
necessidade de estarem juntos, mas sim, a transa deles foi a mais longa da
história.
Sua ejaculação semanal é também uma
oferenda às escravas, para conter a necessidade delas de relação sexual com o Bruxo.
O falo do Bruxo é naturalmente viril, tem uma força extrema e quando está com a
Bruxa sempre está ereto. O pós sado masoquismo foi inventado antes do sado masoquismo.
Pós sado masoquismo é o sado masoquismo com amor, é o ato sexual do Bruxo com a
Bruxa. O Bruxo tem autocontrole: regra a alimentação, tem vida esportiva ativa,
medita com frequência. Porém, o Bruxo abusa de substâncias viciantes que agridem seu
organismo; por
isso, há um grau de descontrole na vida do Bruxo, mas ele tem poder frente ao
descontrole, ao caos – sim, o Bruxo controla o caos,
produz o caos, o segundo nome do Bruxo é Caos. Ele mescla os excessos
narcóticos com uma vida radicalmente saudável, já que precisa sempre dos
extremos dentro de si. O Bruxo necessita da borda, estar na borda em sua vida,
e o sexo nasce da borda, da força do corpo sadio, da violência do corpo narcotizado,
da potência da mente genial do Bruxo, que é um gênio, da loucura do Bruxo
causada pelos abusos da narcose. Os extremos dos hábitos do Bruxo se
cristalizam no sexo com a Bruxa. O sexo entre o Bruxo e a Bruxa marca a força
dos dois e mostra que a relação é transcendente – Amor Bruxo, não o amor das
pessoas comuns. O sexo é o ritual mais potente dos dois, ocupa a maior parte da
relação. O empoderamento do Bruxo produz o sexo empoderado que produz mais
empoderamento. O sexo, por ser Sexo Bruxo, como disse, não concerne ao sexo das
pessoas comuns, mas certas práticas comuns são usadas pelo Bruxo, porém, sempre
com grandes margens de desvio. O Bruxo sabe que mil posições podem ser
experimentadas em uma posição apenas. A posição mais comum pode tomar formas
caóticas. O sexo com proximidade extrema, também física, a vontade de que o
falo atinja a partir da vagina o ventre da Bruxa, indica um desejo de
transformar o Dois em Um (21), eliminar todo o resto, fundir os dois corpos em
um novo corpo; esse novo corpo teria dois terceiros olhos, ou seja, o corpo
mais poderoso já concebido. Os poros da pele do Bruxo são bocas que querem
beijar outros poros, ou seja, outras bocas, são línguas que querem sentir
outras línguas (poros), são olhos que choram e piscam e veem outros olhos
(poros), são narizes que cheiram a pele dela. Ou seja, apenas o toque, a pele
com a pele, a negação da penetração comum, pode permitir uma experiência sexual
única. Como obra do Bruxo, o Sexo Bruxo é só um meio, ele não busca um fim, o
corpo da Bruxa para ele é algo a ser mapeado. Ele pode ficar dias tocando os
pés, as mãos, a ossatura de todo corpo, o rosto, os seios, o sulco vaginal (que
sempre revela algo singular), o cabelo, o pescoço da Bruxa... perceber suas
pequenas imperfeições também, já que são lindas. Sim, o Bruxo pode passar dias
apenas tocando sem pensar em penetração, e quando tem ereções fortes, simplesmente,
respira, relaxa e controla. O Sexo Bruxo pode se realizar também apenas pelo
olhar. O Bruxo pode ter uma relação com uma Bruxa (que muitas vezes não sabe
que é uma Bruxa) sem ao menos tocá-la; ele pode apenas estar presente com ela, a
olhando, contemplando seu corpo, seu sorriso, sua fala, como ela se comunica
com os outros – essa é a radicalidade do Sexo Bruxo, o sexo sem contato físico
originado da potência do terceiro olho. O Bruxo é sempre guiado pelo amor, mas o
Amor Bruxo, não o amor dos seres comum; ele tem uma relação profunda com as
mulheres, encanta elas, já que nunca se considerou um homem, mas sim um Bruxo.
Os sentimentos femininos, a feminilidades, são visíveis no Bruxo: nos seus
olhos, na fala, na forma como caminha, como beija, toca, nas suas lágrimas. Elas
sabem o respeito e apreço dele pelas mulheres. Porém, o Bruxo continua sendo
homem, e como homem ama a guerra, o jogo, a batalha, ama a morte em si e nos
outros, ele é violento; ou seja, como disse, um assassino amoroso, um assassino
que ama o amor. Essa dubiedade – amar o amor, amar a violência – pode ser experimentada
sem muitas contradições; mas o Bruxo pode ser destruído como Bruxo se desejar uma Bruxa como único amor. Ahhe Krimynem, na
Antologia dos Últimos Textos Profanos, relata uma história que exemplifica
isso:
Experimentou
estações de amor com três bruxas, amou elas, uma a uma. A sequente sempre era o
amor de sua vida. Disse para a última: nunca amei alguém como amei você, você é
meu último amor, depois de você não quero mais amar ninguém e, por isso, finalizo aqui
minha história. Ele foge dela, já que não queria um sentimento tão forte, um
sentimento que o aprisionaria; se flanasse no sentimento deixaria de ser Bruxo
e viraria um esposo, e o Bruxo por sua natureza deve amar continuamente Bruxas
por estações. Ele se desliga do jogo contínuo com as Bruxas, não fica com a
verdadeira amada, e se torna um guerreiro. Ou seja, passa a amar apenas a
guerra.
..........................................
O Bruxo só se torna Bruxo tendo uma
relação profunda com a morte: desejar ela, ter vivido algum acontecimento
arrebatador... o Bruxo está numa tensão constante com a morte. Ele sempre está
em batalha, provoca duelos, arrisca seu corpo. O Manifesto
Memento Mori detalha as relações do Bruxos com a morte.
Dormia
em baixo de uma espada, grande e afiada, pendurada no teto com uma corda. Ele
banhava a corda com gordura de porco e colocava no aposento ratos. Os ratos
mastigavam a corda banhada. A espada nunca caiu no corpo do Bruxo, porém, esse
contato com a morte, ainda mais na hora do sono, o tornou radicalmente potente.
[...]
O
oráculo diz ao Bruxo que ele vai morrer em batalha, mas que sua história
atravessará os tempos. Ele fica feliz, se tornaria um dos Bruxos mais
conhecidos, um Bruxo Herói; assim, decide viver sempre em batalha, persegue
guerras, se alista, consegue postos importantes em muitos exércitos; o contato
com a morte sempre lhe dá poder, e ele realmente se torna herói; porém, acaba contraindo
uma doença terminal. Ao saber que iria morrer na cama de um hospital, se
assusta, já que tinha se tornado um grande herói, mas não tinha morrido em
batalha.
[...]
Uma
fenda numa parede; depois da fenda há uma corda, essa corda sustenta um
quadrado de madeira cheio de objetos cortantes. O quadrado fica no teto, uns metros
à frente da parede com a fenda. O Bruxo fica embaixo do quadrado e brinca: joga
um machete, tentando o fazer passar pela fenda e cortar a corda; se conseguir,
o quadrado cai em cima dele e, então, pode morrer. O Bruxo faz isso uma vez por
semana; ele sabe que é muito difícil de acertar, mas com prática, ou por sorte,
pode conseguir ganhar o jogo, ou seja, perder. O Bruxo friamente tenta ganhar o
jogo, sabendo que se ganhar vai perder. Após meses de prática, o Bruxo fica
cada vez mais forte, pelo contato com a morte. Porém, mesmo que deseje jogar
todos os dias, ele sabe que a potência depende da contenção, e ele se contém. Ele
quer acertar, mas pode morrer e tem que desejar morrer, mas não pode morrer.
[...]
O
Bruxo aprendeu a respirar profundamente com os Sadhus A respiração funda é
exatamente liberar o máximo de ar e inspirar o mínimo possível; com isso, o
Bruxo conseguia atingir níveis elevadíssimos de inconsciência. Porém, na prática
contínua, sabia que inspirar, por certo tempo, pouco ar poderia causar uma
paralisia cerebral. A prática para o Bruxo era uma forma de contato com a morte
muito prazerosa. [...] Há um tipo de serpente desértica, parente da Naja, que
libera um veneno, mas cada picada tem uma quantidade diferente. Ser picado por
ela pode não fazer efeito nenhum ou pode levar a morte súbita. O Bruxo, uma vez
por ano, durante toda sua vida, atacava sua serpente a fazendo o picar. Em todo
esse ciclo as doses de veneno sempre foram muito amenas. [...] O Lobo Branco Nórdico é dócil, mas pode
não reconhecer o dono em determinados momentos; nesses momentos, o Lobo pode o atacar
mortalmente. O Bruxo durante toda sua vida teve Lobos Brancos como seus animais
domésticos, mas nunca foi atacado.
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O Bruxo tem pelo menos quatro
personalidades, personagens, que atuam em certos blocos de tempo, e em cada bloco
de tempo, o Bruxo finca moradia em uma localidade diferente. As personalidades
são criadas a partir da percepção das pessoas comuns em relação ao Bruxo.
Quando ele chega em um novo lugar, apresenta uma personalidade escolhida por si
e, ao mesmo tempo, cria uma aura de mistério sobre ele. Os moradores começam a
fazer indagações sobre a presença e identidade do Bruxo, a partir daí os
personagens vão sendo desenvolvidos, e o Bruxo tenta afirmá-los e escondê-los
ao mesmo: um dia age de uma forma, no outro de outra, às vezes, conta histórias
estranhas sobre si; porém, a primeira personalidade se mantém como a dominante.
Isso causa um grau enorme de estranhamento nos moradores. Muitas vezes, os moradores
podem acreditar que ele é realmente todas as personalidades que ele insinua,
mas o Bruxo faz o máximo possível para que as dúvidas em torno dele não sejam conscientemente
expressas. O Bruxo faz isso, já que o medo a partir da dúvida lhe dá forças. Muitas
vezes o Bruxo encarna tão bem seus papéis, que ele mesmo passa a acreditar que
é seus personagens; e se ele conseguir acreditar em todos papéis, mesmo que
seja apenas por certos momentos, ele pode se perder neles e não voltar ou realmente
se empoderar. Drek Niuwtloverd, nas Fábulas Amaldiçoadas, conta a história de
um dos personagens criado e vivido pelo Bruxo Carlfautz:
Carlfautz
chegou no vilarejo e disse a todos que ele era Amón. Amón estava desaparecido
por anos, já que tinha sido morto na guerra. Todos acreditaram que era Amón quem
havia retornado, até mesmo a sua esposa. A esposa amava Amón e só não tinha se
suicidado, pois acreditava que ele voltaria. O amor da esposa, que era uma Bruxa
e não sabia, trouxe o Bruxo ao vilarejo. Ele sabia da história, sonhava
constantemente com o vilarejo, com Amón e sua esposa; o Bruxo estava enamorado por
ela. Ao viver a identidade do marido, acabou se apaixonando pela esposa e, mais,
passou a acreditar que era Amón e, assim, esqueceu de sua identidade verdadeira.
Porém, a Bruxa começou a perceber que era Bruxa, e assim ficou empoderada,
entendeu que Amón havia morrido e que o Bruxo era um Bruxo. Ela se apaixona
pelo Bruxo, diz a ele que não é Amón e que ela nunca havia amado Amón, mas sim
o Bruxo. Ficaram juntos uma estação completa e depois se separaram, já que é da
natureza dos Bruxos a efemeridade extremamente intensa.
No mesmo livro aparece a história do Bruxo Ohlinve
que reinventou sua história para ter mais poder.
Passou a dizer a todos
que era fruto de um estupro e todos acreditaram. Após um tempo, ele mesmo acreditou
na história. Fez isso, pois os estupros são ações de uma classe específica de
demônios, os Iritas. Quem é gerado a partir do estupro se torna um tipo de
demônio de força extrema. Para ter essa força, Ohlinve aceitou
a ideia de que seu pai não era seu pai e que sua mãe havia sido violentada.
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O Bruxo sente uma forte atração pela
espionagem, ele pode realizar trabalhos como espião para o aparelho de Estado. Ele
age para o aparelho, mas busca exatamente a despersonalização própria à
identidade de espião. Ele, assim, age por si mesmo, já que gosta de contemplar
a mentira, a falsidade, o engano. O teatro é sua forma de existência, e ele
acredita no teatro, ele não tem vida, tem muitas vidas e se perde nelas. A questão do jogo inerente ao Bruxo é
exposta no Manifesto do Vigésimo Primeiro Minuto da hora Final do Bruxo:
Ele
era um ótimo ator, amava a crueldade em si mesmo. Ele se colocava como objeto a
ser destruído: com corpo belo andava nu em tabernas e homens o atacavam
sexualmente, andava como um bobo pelos vilarejos e todos o apedrejavam; ele fazia
o possível para sofrer a paixão triste dos outros, mas como não era Cristo, ele
fazia isso para ter uma desculpa para destruir os outros.
[...]
A
Bruxa Suntka encantava homens para o seu Bruxo os destruir. Ele dizia a todos:
não toquem nela, nós nos amamos, mas ela jogava olhares sedutores aos homens
que desejavam o que o Bruxo tinha. Após consumado o desejo dos homens, o Bruxo
os destruía, já que isso faz parte da lei, e ambos, ela e ele, se deliciavam.
[...]
O
Bruxo Demis Rokano peregrinou por estações sem rumo. Um dia parou numa
estalagem em um pequeno vilarejo. Ficou na estalagem, sentia que deveria ficar
ali. No sexto dia chegou no local um senhor distinto, estranho para o ambiente.
O Bruxo e o senhor logo começaram a se relacionar; as pessoas ao redor olhavam
admiradas para o contato entre os dois, o que falavam, como falavam, como ao
conversar se relacionavam com o entorno. Um dia, Demis disse ao senhor que, na
verdade, era Satã e que estava ali para decidir sobre a vida dos moradores da
região; falou isso e pediu que não fosse contado; ao mesmo tempo, o senhor revelou
que era um sacerdote, que tinha peregrinado por anos para encontrar Satã. Demis
perguntou se haveria guerra, o sacerdote afirmou que apenas queria aprender com
ele, com Satã, mesmo que fosse radicalmente contrário ao que Satã representava.
Demis disse que o respeitava também, e que poderiam manter o diálogo. Os dois
ficaram muito tempo juntos na estalagem se relacionando. As pessoas do entorno
se sentiam mal com a presença deles, mas também impotentes; não sabiam a
verdade sobre os dois, mas intuíam que eram seres mágicos... um dia Demis,
ainda se nomeando de Satã, disse ao sacerdote que, na verdade, buscava exatamente
ele, o sacerdote. Este não era bom, era sim mau, e deveria ser punido. O
sacerdote enlouquece na hora, sai correndo e se joga em um penhasco. E sim, Demis
era um Bruxo, sabia que o sacerdote era mau, e apenas iluminou-o, mostrando a
verdade, e o sacerdote não suportou a verdade sobre si mesmo.
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Qualquer um, ao abusar de drogas
por um longo tempo, fica com a percepção eternamente modificada, o terceiro
olho aparece, e quando aparece isso pode levar ao reconhecimento de que se é um
Bruxo. Uma
obra não referida a Bruxos, O Último Livro Sobre a Flora Profana, mas
importante para a bruxaria, apresenta drogas potentes pouco conhecidas.
Uma
droga criada pelos Idilista, a partir de um fungo raro, permite longos períodos
de ereção, mas com controle ejaculatório. [...] A Munova faz com que o corpo
não se definhe após períodos frequentes de narcose. [...] A Saitka permite com
que o usuário esteja sempre em transe mesmo sem aparentar. [...] O pólen da
Flor Latah cria viagens ao inferno na hora do sono e não causa nenhum sintoma
de vicio ou de ressaca. O efeito mais surpreendente do pólen: as pessoas que
estão dormindo próximas de quem usou a droga são acometidas por alucinações.
As Bruxas ajudam o Bruxo na escolha das drogas,
já que elas são as conhecedoras e manipuladoras da alma dos elementos da flora;
com seu poder, elas dão poder ao Bruxo.
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Como disse, o Bruxo pode ser criado por si
mesmo, tendo intuição e reconhecendo a falibilidade dos métodos. O texto buscou registrar então as atividades
bruxas que atravessam as eras. As polis avançadas impõem a amizade e respeito
aos cidadãos. Os Bruxos aparecem na polis como uma forma de resistência a falsa
harmonia. Bruxos são criados em batalhas, prisões, nas naus dos loucos, na
alcova com as Bruxas. Termino o texto com uma passagem do Livro Sete da Possessão:
Sethtre,
vivendo na polis e sabendo da impossibilidade de uma existência singular, ao
encontrar o livro sagrado decide ser um Bruxo. Ele comete um crime, de
propósito, e é condenado a viver em um vilarejo no qual estão os seres mais
perversos possíveis. Ele fez isso – cometeu o crime para ser condenado –, pois sabia
que para ser um Bruxo teria que passar por uma provação de dor. Ele fica ali, no
vilarejo, durante anos, sofrendo; porém, depois de um tempo, passa a ter
liderança no espaço, constrói um exército e luta contra a polis. Sethre, logo
após, desaparece, mas ressurge como Bruxo em inúmeros cantos do
planeta ao longo da história.