Eu não aceito que me vejam como um fraco,
um pobre, um gay, uma mulher, um perdedor, vou lutar para que me vejam como
alguém bem-sucedido. Sou um pudico, um boca limpa, só uso belas palavras. Todos
cagam, mijam, espirram, vomitam, transam, suam... corrimento sai da vagina,
porra do pau, onda vermelha. Idiotas inspecionam as fezes. Sangue do nariz
cheirado. O banheiro fede a merda, a mijo. A toalha usada tem o cheiro meu e
dela. Mas escondo isso já que tenho vergonha do corpo, do meu corpo, do dela,
de todos. Eu nunca menciono isso, não há merda em meu trabalho intelectual, já
que intelectuais não tem cú. [......] Ela gosta do doce do pênis, ele gosta do
doce do cú, eles e elas gostam do salgado da vagina. Ele beija ela depois de a
chupar e nunca limpa a boca. Ela chupa o pau dele e ele beija ela. Ela chupa o
pau do amante e depois beija ele, e ele faz algo parecido. Ele chupa a vagina
do seu amor menstruada. Nós cultuamos urina, merda e sangue. Fumantes queimam a
pele, e pele queimada tem o seu cheiro. Depois do corte rola a cicatrização,
purulenta; e o pus é tão doce. Quando criança ele cagava, colocava os dedos nas
fezes e pintava as paredes; virou um grande artista. Quem fuma conhece e muito
bem o catarro, quem tem asma também. O catarro às vezes mais perolado como
porra, às vezes mais amarelado, purulento, às vezes com sangue. Ele gosta de
lamber a pele dela de noite, mesmo que ela só tenha tomado banho de manhã;
gosta do gosto da axila meio depilada e daquele cheiro forte de gente no verão.
Tava todo mundo no fumódromo, ou na fila do banheiro se beijando, se agarrando
– sem penetração já que no caso era algo secundário – muitos já tinham
vomitado, todos estavam com a boca seca dos crivos e da biras, muitos tinham
herpes e hpv e nem sabiam; mas e daí? Anjos não são assexuados, anjos trepam em
qualquer lugar, chupam o que aparecer na frente, só não chupam os próprios
dedos. Beijar uma boca que acabou de vomitar é amor. [...] E tudo isso é feito
por gente que sabe muito bem o quanto o corpo é podre e, por isso, delicioso.
Essa gente não tem nojo de si, do seu corpo. Mas se essas relações com o corpo
forem expressas na mesa de jantar, ou em sala de aula, ou na reunião da
empresa, se forem faladas para a esposa, ou para as amigas delas, ou
ao pai e a mãe, para as pessoas sérias de forma aberta,
melhor, radicalmente aberta... quem fizer isso vai ser visto de qual forma? A assepsia da ciência; a ciência como um espaço para pessoas sérias falarem sobre coisas sérias; e o corpo
que pulsa o tempo todo, caga e mija, sempre... isso deve ficar de lado. [...] Burroughs é o corpo na literatura, principalmente
as moléculas do corpo. Kerouac era um corpo em movimento na estrada, mesmo que
em Big Sur as moléculas fossem expostas a partir do delirium tremens. [....] O louco
queria que os banheiros de apartamentos tivessem uma sacada, grande. Daí ele acordaria de manhã e daria uma boa cagada curtindo a
vista, as ruas, as pessoas, a cidade. Uma relação anal com a cidade. [....] “Coprolalia”
é um termo interessante, se refere às expressões obscenas, mas que são usadas
em poucos espaços, nas ruas, em ambientes de ócio. Quem tem Tourette sabe bem o que fala e faz:
cospe, pula, xinga não está nem aí e que se foda. Ele fala a verdade, reconhece
uma puta que esconde que é puta, ele a vê e diz, berra: sua puta! Quando tem
alguém escroto, ele cospe nele, e sabe o que faz. Ele assusta já que mostra a
verdade que ninguém quer ver. Sabedoria de quem tem Tourette, sabedoria dos loucos. [....] Os punks não são menininhas,
curtem o corpo: o vocal do The Clash pegou hepatite já que cuspiram dentro da
boca dele em um show; a famosa cusparada no show punk. Sid Vicious pegava água
de latrina para se picar. Lou Reed queria que cagassem na cara dele. A banda
xinga a plateia e a plateia xinga a banda, todos no show se cospem, se batem: o
punk tem Tourette. Os Titãs sempre
foram meio punks, eles não tinham medo de falar a verdade: “amor, eu quero te
ver cagar”. [....] A sabedoria das pregas do cú. Quem dá o cú não
fala sobre o cú ou dar o cú. O cara dá o cú, mas escreve sobre florzinhas e
amor. Não fala, exatamente, do que conhece já que sabe que vai ser bloqueado
nas redes sociais, não vai conseguir emprego em um jornal, vai se queimar em
sala de aula... e se falar sobre dar o cú em uma revista acadêmica, vai ter que
modular o tom, de tal forma, que o texto não tenha mais o cheiro doce de cú.
..................................
O
louco é tão louco que tem cinco sentidos, mais o sexto. Só que o sexto não é um
sentido a mais, mas a relação entre todos os sentidos. [....] Ele sente um
orgasmo especial quando transa, orgasmo no peito, no coração, no pulmão; sim, o
coração quase explode junto do orgasmo genital, ou antes dele; antes ou junto,
tanto faz, tão bom quanto. [....] O morto está morto, como disse Gullar, mas o
louco está vivo, e o louco está louco. O louco não come uma vagina, ele é
comido por ela. O louco vê ela sorrindo, mas sabe que ela está triste. O louco
sabe que “um doze” pode ser “um vinte um”, e vinte às vezes está bom, é uma boa
mesa no jogo de poker. [...........] A transa de um casal diz respeito aos
dois, mas não apenas, diz respeito a muita coisa, muitas pessoas. Duas legiões
que se encontram, não para entrar numa batalha, mas para produzirem algo em
comum. Ás vezes funciona, às vezes não, e quando funciona... são as
singularidades das duas legiões agindo em comum: um sentindo o outro na
performance que não é teatro; sem nóias, chatices e frescuras. [....] Quando
eles acordam – aquele casal que vira a noite – e tem umas seis camisinhas
usadas no chão, bem usadas, eles dizem, sem vaidades, um pouco surpresos: a
noite foi boa com a gente.... e, vamos transar antes do almoço? [....] O
hipster entende as hipsters. Os casais hipsters são a união de dois
indiferenciados. O hipster faz bem o papel de mulherzinha, de amigo, de
carinhoso, ele sabe chupar como uma mulher. O hipster, para ser um, teve que se
tornar isso: a melhor amiga da sua mulher na cama. O nerd, se ainda existem
nerds – já que os hipsters são a evolução dos nerds –, o nerd é o gatinho na
cama, reprimido, guiado pela mulher. Já o grosso, o rude, se sente mal na cama,
sente vergonha e goza rápido, já que estar junto de alguém de uma forma íntima
é quase impossível para ele. [....]
4 comentários:
Ainda não dormi, então ainda é minha madrugada e geralmente consigo me expressar melhor nela. Como sou pudica, tomei Rivotril, mas ele não fez efeito.
Esta semana aqui no Rio de Janeiro (sou carioca) uma foto com três jovens tomando banho de sol em um trecho interditado do BRT viralizou nas redes sociais. Li vários comentários ofensivos de repúdio ao ato. Interessante é que uma parcela considerável daqui do Rio fica torrando no sol escaldante do verão na praia, mas tenho a impressão nos comentários que li que elas cometeram um crime. Não teve helicóptero da polícia em cima delas não...que sorte.
Lendo esse texto me vieram à mente essas meninas. Somos tão iguais e ainda pensamos que somos diferentes. Lembra no tempo do Orkut que havia umas comunidades do tipo "A Sandy não caga"? Penso que há pessoas que acreditam nessas coisas.
O que poderia ser feito para curar? Uma visita ao IML para conscientização de que depois de horas o corpo é só uma carne apodrecida? Pensemos...
Vou provar aqui que não sou um robô e tentar dormir.
Patrícia.
hum; citou BRT, é do Rio mesmo; tava pensando que era alguma ex querendo me alugar. mas uma ainda pode.
Hahaha, existe alguma outra forma de chamar BRT fora do Rio ou as pessoas não conhecem???
Sim, sou do Rio, falo bixxxcoito. Só não te falo para passear aqui porque a violência está grande. Sou nenhuma ex sua não..rsrs (perseguição de ex deve ser uma merda).
E não dormi de novo. Eu tenho vontade de conhecer a Coreia do Sul e acho que minha mente já deve estar se programando para o fuso horário. Só pode! Abraço!
Ah! Aqui também tem VLT..rs Andei para ver como era no período da gratuidade, porque fora isso, nos trechos curtos ali no Centro, é muito mais rápido circular a pé. Falei do VLT para provar mesmo que sou carioca. Realmente fiquei comovida com sua angústia de ser alguma ex te enchendo.
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